Publicado em 18/05/2020 às 14:02 - Atualizado em 11/10/2023 às 12:57
Foto: Pixabay
Com a suspensão das atividades escolares, em virtude da pandemia do novo coronavírus, instituições de ensino passaram a buscar alternativas para substituir as aulas presenciais. As atividades na modalidade ensino a distância (EAD) ganharam impulso, com uso da internet e de aplicativos de comunicação. Porém, a preocupação dos gestores públicos com parte dos estudantes que não possuem acesso à banda larga abriu o caminho para a utilização de um outro meio de comunicação bem conhecido de todos nós: a televisão.
Em São Paulo, por exemplo, o governo do estado anunciou uma parceria com a Fundação Padre Anchieta, para disponibilizar conteúdos educativos aos estudantes da rede de educação básica por meio da recém-criada TV Cultura Educação. Em Uberlândia, a Prefeitura Municipal seguiu o mesmo caminho, com o programa Escola em Casa e, em parceria com a TV Universitária de Uberlândia, pretende disponibilizar 13 horas semanais de programação educativa para atender aos seus alunos.
A trajetória da TV educativa no Brasil é marcada por inúmeros projetos. Uma das primeiras experiências no país foi o programa "Admissão pela TV", criado em 1961 pela TV Cultura de São Paulo, ainda em sua fase comercial. O programa integrou o projeto "TV Escolar", da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. Com uma produção bastante simples, ficou marcado pelo improviso e pelo pioneirismo.
O Rio de Janeiro assistiu, ainda nos anos 1960, a outra experiência de ensino pela televisão. O "Curso do Artigo 99", organizado pelo professor Gilson Amado e transmitido pela extinta TV Continental, ficou no ar entre 1966 e 1970 e foi um dos primeiros projetos da televisão brasileira que mobilizou profissionais minimamente especializados. Os professores eram remunerados, as aulas eram gravadas e as apostilas, impressas.
A partir do final da década de 1960 e início dos anos 1970, surgiram diversas emissoras educativas no Brasil. A primeira a entrar no ar foi a TV Universitária do Recife, canal 11, mantida pela Universidade de Pernambuco. À época de seu surgimento, a emissora participou ativamente da luta pela audiência de aproximadamente 700 mil nordestinos, contra as duas concorrentes comerciais: TV Rádio Clube e TV Jornal do Comércio. Sua programação, nessa fase inicial, totalizava 5 horas diárias e era constituída por programas instrucionais, teleteatros, debates, entrevistas, documentários e musicais.
Em 1967, o Governo do Estado de São Paulo adquiriu a TV Cultura do Condomínio Diários Associados de Assis Chateaubriand, pioneiro da televisão no Brasil. Mantida pela Fundação Padre Anchieta, a TV Cultura construiu uma programação cultural e educativa de qualidade e, dentro de pouco tempo, tornou-se a principal responsável pela produção de programas educativos que seriam reprisados para todo o Brasil por outras emissoras. Um dos destaques foi o "Madureza Ginasial".
Em 1978, a Fundação Roberto Marinho, em parceria com a Fundação Padre Anchieta, levou ao ar o "Telecurso 2º Grau". Pensado como um programa multimeios, com exibição na televisão e no rádio, venda de material impresso em bancas de jornal, exibição em locais específicos, chamados de Centro de Recepção Organizada. O "Telecurso 2º Grau" inovou ao trazer elementos da produção de programas comerciais, como uma edição dinâmica e uso de recursos audiovisuais variados. As disciplinas do currículo eram apresentadas por diversos atores da Rede Globo, dentre eles: Antônio Fagundes (Biologia), Marília Gabriela e Mário Lago (Química), Marco Nanini (Matemática), Kito Junqueira (Língua Portuguesa), Jorge Fernando (Educação Moral e Cívica) e Gianfrancesco Guarnieri (História). O "Telecurso 2º Grau" se tornou um modelo de utilização da televisão para fins educativos e, nas décadas seguintes, ganhou novas versões, como o "Telecurso 2000".
Nos anos 1990, surgiram outras experiências importantes em TV Educativa, com destaque para a TV Escola e para o Canal Futura. O projeto TV Escola nasceu em setembro de 1995, a partir de um convênio da Fundação Roquete Pinto com a Secretaria de Educação a Distância do MEC. A TV Escola era uma emissora a cabo voltada exclusivamente para a educação, com 18 horas diárias ininterruptas de programação, e que tinha por objetivo colaborar na formação de professores e na difusão de conteúdos para uso nas escolas públicas brasileiras. O projeto contou com a distribuição de kits audiovisuais para as escolas.
Já o Canal Futura surgiu em 1997, a partir da experiência da Fundação Roberto Marinho em projetos educativos, sobretudo o Telecurso, e contou com a parceria de empresas privadas para seu financiamento. A emissora organizou-se como veículo de prestação de serviço social e se comprometeu com a produção e a difusão de conteúdos educativos, elaborados com base em considerável qualidade técnica.
A década de 1990 marcou o último grande momento de ações e debates sobre a televisão educativa no Brasil e no mundo. A concepção de TV educativa que surgiu nos anos 1950 como um sonho, uma utopia buscada por inúmeros entusiastas, e que atravessou gerações deixou de existir. Ao final dos anos 1990, as experiências educativas na televisão passaram a buscar a interface com a internet.
Nos anos 2000, a expansão e a popularização da rede mundial de computadores e a crescente difusão da banda larga ampliaram consideravelmente os horizontes da educação a distância, tornando a televisão um meio secundário nas experiências educativas. Em 2020, a retomada da TV educativa, como política pública educacional, abre uma nova fase dessa história.
*Wellington Amarante Oliveira é professor do Curso de História do Instituto de Ciências Humanas do Pontal da Universidade Federal de Uberlândia. É coordenador do Laboratório de Pesquisa e Ensino em História (LAPEH) e membro do Laboratório de História Digital (LAHISD). Desenvolve pesquisas nas áreas de História da Televisão, História Pública e Ensino de História.
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