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O brilho da simplicidade

Data de Publicação: 14/07/2009 - 08:58
Mais do que uma trajetória pessoal de sucesso, a história do técnico administrativo Sebastião Barbosa, o Tião, ensina que alguns valores marcam para sempre
Em tudo que fez, em todos os lugares por onde trabalhou, deixou a mesma impressão de carinho, honestidade e discrição. Palavras um tanto raras no cotidiano das relações travadas nos grandes centros urbanos dos séculos XX e XXI. Mas foi com elas que ele escreveu sua trajetória, desde que saiu do Rio de Janeiro, em 1971, e chegou em Uberlândia, com 17 anos de idade. Técnico em medicina física – hoje auxiliar de fisioterapia – Sebastião Barbosa, mais conhecido como Tião, trabalhou em clínicas particulares até chegar à Universidade Federal de Uberlândia (UFU), em 1977. Metade do tempo era, então, dedicado à fisioterapia de reabilitação, na Faculdade de Educação Física. A outra metade trabalhava como modelo vivo, posando para estudantes do curso de Desenho, na antiga Faculdade de Artes, quando ainda funcionava na Fernando Vilela. "Quando se tem um irmão doente, com uma doença que você sabe que não tem cura e que tende a piorar com o tempo, e você escuta este irmão te falar, todo dia, que tem um cara que trata dele, que lhe faz massagens, que é muito legal e atencioso, esse cara passa a ser, pra você, muito especial". O depoimento de Luiz Carlos de Melo, técnico de informática da UFU e irmão de Volmer de Melo, que driblou a distrofia muscular por 40 anos, com a ajuda de sessões diárias de fisioterapia, fala por si só. Segundo ele, "todo o pessoal da Educação Física era lembrado, mas o Tião era especial" para o irmão, "por causa do amor que punha em tudo que fazia". "Muito profissional, excelente. De todos os que passaram por aqui, Tião foi o melhor. Tinha muita disciplina, ficava até duas horas quieto, sem se mexer, fazia questão de ser perfeito", lembra a professora de Artes, Ana Maria Araújo Cunha, já aposentada. "É um trabalho penoso, cansa muito, mas eu gostava... quando comecei era novidade em Uberlândia... fiz isso por 21 anos", diz Tião. Do contato com os artistas, da vivência como modelo, "começou a surgir um interesse", como ele mesmo conta, "pela escultura". A professora Línea Resende Azevedo, também aposentada, lembra que Tião nunca gostou do contato das mãos com a argila, "mas quando comecei a trabalhar o cical (material parecido com o cimento) com os alunos, ele gostou e se identificou com o material". No início (mais ou menos em 1986) ele passava, vez por outra, pelos laboratórios (oficinas de arte) e mexia, aqui e ali, só experimentando, diz Línea. "Como todos gostávamos dele, íamos dando uns toques, ensinando e permitindo que ele experimentasse, por si só, e veja no que deu". E no que deu? Tião virou artista plástico de verdade. Sua última exposição – Sonhos - realizada em abril passado no saguão da biblioteca do campus Santa Mônica, tinha 17 esculturas, de vários tamanhos e materiais: gesso, cical, cerâmica, pedra sabão e bronze. Impossível não querer tocar as peças expostas, primeiro de leve e depois, já mais confiante, escorregar a mão pelas superfícies tão lisas, tão escorregadias, tão convidativas ao toque. No meio de formas que lembram seres, homens ou bichos, sobressai a figura da mulher: "ela é tudo, é o presente e o futuro também, é a perpetuação do ciclo da vida", explica Tião, e isso explica a predominância do feminino na sua obra. Apesar da avó ser "muito católica", como ele diz, Tião não tem religião. "Conheci muitas seitas, mas não segui nenhuma", afirma. Gosta de "inventar" na cozinha, de cinema, e de jogar peteca. Se não reuniu um milhão de amigos, nesta vida, chegou perto, pois todas as vezes em que esta reportagem me levou a perguntar a alguém, sobre o Tião, a resposta foi quase sempre igual. "Se eu conheço o Tião? Ele é meu padrinho de casamento, trabalhamos juntos por mais de 20 anos... como ele é? Ah, ele é muito ‘na dele’, muito discreto, respeitador... é muito amigo, inteligente, uma pessoa muito boa". Desta vez quem fala é Marta Helena Rosa da Silva, secretária do Departamento de Artes Visuais da Faculdade de Artes, Filosofia e Ciências Sociais.

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