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“Perseguição é palavra proibida na nossa gestão”

Data de Publicação: 05/12/2012 - 09:15

Por Mariana

Elmiro Santos Resende, novo reitor da UFU, fala sobre projetos e expectativas para os próximos quatro anos
Um mapa de Minas Gerais, computadores, uma pequena sala de conferência. No subsolo do Hospital de Clínicas (HC-UFU), está instalado o Setor de Telemedicina, coordenado pelo professor Elmiro Santos Resende. Foi nesse espaço, onde médicos cardiologistas de várias instituições trocam informações sobre exames e diagnósticos, que o novo reitor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), nomeado no dia 30 de novembro, recebeu a equipe da Diretoria de Comunicação para falar sobre projetos, sonhos e expectativas. Saiba como a nova gestão deverá conduzir a universidade nos próximos quatro anos. Orçamento, rumos do maior hospital público da região e nomeações para postos-chave foram alguns dos assuntos que você confere a seguir. Este ano, o orçamento da UFU chegou a aproximadamente 1 bilhão de reais - um marco – sendo que apenas 31 municípios do Brasil têm um orçamento que chega a este teto. Com este montante, qual a expectativa da nova gestão? Este número demonstra que hoje estamos em outro patamar da universidade. Nós, que já tivemos a oportunidade de atuar como dirigentes da UFU, sabemos da dificuldade que é trabalhar com orçamento muito restrito. Isso nos traz expectativas muito boas e uma responsabilidade muito maior. Isso é dinheiro público. Nós temos que investi-lo muito bem, temos que ter todos os controles necessários. Agora, é preciso entender que mais de 600 milhões de reais vão direto para a folha de pagamento. Ele não entra exatamente no processo de gestão da universidade. Nós ainda temos uma matriz de alocação de recursos para as unidades acadêmicas – que ficam com boa parte do remanescente. Portanto, na realidade, o que temos de recursos pra custeio e para investimento ainda não é tão grande assim. Mas ainda assim mostra que é um diferencial grande neste momento, o que nos dá uma possibilidade maior de adiantarmos o processo de administração da UFU, buscando o que tanto almejamos. Um dos desafios agora é a construção dos campi de Patos de Minas e Monte Carmelo, uma vez que já houve processo de licitação. Nós temos de implantar os campi fora de sede e seus cursos. Existem cursos novos que ainda têm demanda grande não só de professores, mas também de instalação de laboratórios adequados, salas de reuniões... E lembrar que Monte Carmelo e Patos de Minas, na realidade, são campi que temos de iniciar o processo de construção. Temos de fazer um processo de discussão grande com todo o pessoal para fazer a estrutura que seja mais adequada possível para as necessidades daquela área, daqueles cursos que temos lá. Durante a campanha para reitor, a sua equipe percorreu setores da UFU e teve contato com os servidores para ouvir o que desejam, e quais são as principais demandas. O senhor defendeu, durante os debates, o diálogo permanente. Qual a sua percepção, nesses encontros, durante o contato olho no olho. O que é preciso implantar quando se fala em cultura de gestão? Isso é mudança no jeito de fazer, é uma mudança de cultura. Você vai a uma reunião dessa e percebe sentimentos de duas naturezas. Primeiro, uma certa desconfiança de que aquilo não vai pra frente. Ou um certo receio de se expressar. Principalmente, na nossa capacidade de reivindicar. Quando você faz uma reivindicação deve ter embasamento. Não se pede algo porque alguém pediu, mas porque há uma comprovação daquela necessidade. É um exercício que temos de continuar fazendo. Fizemos durante a campanha e acho que a desconfiança fica mais acentuada agora, depois da consulta eleitoral. Estamos tentando quebrar um pouco esse processo. Estamos fazendo reuniões. O senhor citou o sentimento de desconfiança. Sempre que há troca de gestores – em qualquer esfera – as pessoas ficam receosas. O senhor costuma citar, durante as reuniões com servidores, o que batizou de “bullying de gestão”. As pessoas ficam com medo de sofrer retaliações, como afastamento das funções. O que dizer a quem passa por essa ansiedade? A troca de pessoas em determinados postos não significa que você está preterindo essa pessoa em função de outra. Significa que as metodologias às vezes mudam e a gente deve dar oportunidade a outras pessoas. Não significa que quem está saindo vai ser perseguido. Essa perseguição é uma palavra proibida na nossa gestão. O que chamo de “bullying de gestão” (risos) – até me falaram que é inovação na forma de se expressar – isso não pode acontecer. E, se ficarmos sabendo disso, vamos interferir. Aliás, já estamos fazendo isso. Eventualmente, surge uma questão pontual e temos de mostrar que não é assim que se procede. Temos pessoas que são muito capazes, que têm experiência grande e que serão substituídas. Mas que deverão continuar conosco. Vamos precisar dessa experiência. Não somos tantos. Somos poucos. E as experiências adquiridas devem ser aproveitadas no âmbito de uma gestão que quer ser aberta, comunicativa com o pessoal interno e o externo à UFU, e permitir que a gente construa o melhor horizonte possível para essa instituição. E lembre-se: são quatro anos. Parece muito tempo. Mas, do ponto de vista da gestão, acaba não sendo tanto assim. Temos de trabalhar. Estamos construindo um processo administrativo com qualidade. Vamos falar sobre o Hospital de Clínicas da UFU. Ficou evidente, durante os debates, o seu posicionamento em defesa da escolha dos diretores pela própria comunidade do HC-UFU. O processo já está em andamento. Há uma comissão interna, que cuida da transição, dentro do hospital. E essa comissão, a nosso pedido, avançou um pouco no processo e resgatamos o edital antigo de eleições dentro do hospital e vamos fazer isso no mais curto espaço possível. Precisamos ter uma diretoria representativa. E, quando digo representativa, tem de ser gente que representa a comunidade interna do hospital, mas também a externa. Não é possível que uma pessoa queira administrar um hospital sem ter, na sua capacidade de visualizar o problema, a dimensão do problema externo. Portanto, uma diretoria desse nível tem de ser constituída por pessoas capazes de nos representar lá fora e de pessoas que organizam o processo interno. Diante disso, e da alteração do organograma do HC que foi feito pela gestão que nos antecede, foi realizada uma modificação. Tempos alguns postos que serão eleitos, exceto as assessorias. Após a eleição da direção, vamos verificar as pessoas que sejam mais capazes de ocupar as assessorias. Não é fácil. É difícil administrar o hospital, é complicado. Porque dependemos do cenário em nível federal – onde são traçadas as grandes políticas que nos orientam; em nível estadual – que compõe o processo de atendimento da população local e regional –; e municipal – a gestão plena de saúde coloca que há a centralização no gestor municipal. E há uma conta que nunca fecha. Tem uma conta que não fecha. E, quando falamos dos números nacionais, muita gente assusta. Há uma diferença muito grande entre o que é feito e o que é pago. Esse é um dos problemas. Mas nós temos outros na gestão da saúde. Nós temos o problema da formação de pessoas; nas estruturas criadas para o trabalho; precisamos diminuir o desperdício. É sempre possível melhorar. E temos de capacitar as pessoas para que possam atender as demandas dessa população dentro daquilo que podemos fazer. Quer dizer: é preciso ter visualização crítica da incorporação tecnológica – ela é vital em determinadas situações, salva vidas. No entanto, em outras, você acaba gastando muito dinheiro sem melhorar o atendimento a essa pessoa. E a polêmica EBSERH (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, criada pela Lei Federal nº 12.550, de 15 de dezembro de 2011, para administrar unidades hospitalares ligadas a instituições federais de ensino superior)? Essa é a grande polêmica. O problema maior é que cada complexo hospitalar da universidade tem uma história diferente. E, de todas as histórias possíveis - são 46 hospitais -, a nossa é a mais particular. O HC-UFU junto com a fundação de apoio que o administra (Faepu) começou a funcionar antes da formação da Faculdade de Medicina. Muito antes, portanto, da criação da UFU. Há uma relação histórica com a comunidade de Uberlândia e região que criou a possibilidade da existência desse hospital, que administra esse hospital com o que pode – e eu diria que a administração hoje da fundação é muito profissionalizada – o problema é que a conta não fecha. Mas será ou não implantada a EBSERH? A posição do nosso grupo é que não somos radicalmente contra. Mas queremos discutir as bases para a implantação da empresa dentro de uma história já criada. Eu não posso admitir que, da noite para o dia, como num passe de mágica, uma ação dessa igual para todos os hospitais – que são diferentes – possa surtir o efeito desejado. Mas não está descartada? Não. Vamos ver várias questões. Primeiro, como fica a posição da Faepu (Fundação de Assistência, Estudo e Pesquisa de Uberlândia) e do seu hospital universitário? Isso é um patrimônio que pertence ao povo de Uberlândia e  região. Segundo, como ficam os 1200 funcionários da Faepu? Eles terão de prestar concurso. Experiências anteriores mostram que o índice de aprovação não é tão grande. Não porque sejam ruins. É que tem gente, há muitos anos, treinando e se preparando para fazer a prova. Eles não têm tempo de fazer isso. O processo não é simplificado. Outra questão importantíssima: como fica a dívida acumulada ao longo dos anos, que não foi à toa? Foi para manter a atividade médica para uma população que precisa. Ou acham que queríamos ter essa dívida dentro da fundação? Vamos falar sobre transparência. Tivemos, recentemente, por exemplo, casos de denúncias que chegaram ao Ministério Público Federal envolvendo médicos do HC-UFU. Tivemos a denúncia de vazamento de provas do vestibular. Como a nova gestão vai lidar com situações como estas? Temos analisado a questão da transparência, considerada necessária e vital. Agora, nós precisamos ter a capacidade interna de solucionar os conflitos. Se houver comprovação - e temos instâncias capazes de apurar isso dentro da instituição – os desvios terão de ser corrigidos, aplicando-se as penas da lei. Não podemos nos descuidar. Precisamos ser resolutivos. Essa questão, quando foge da administração, gera um problema maior. Não é negar a importância das instâncias reguladoras externas. Mas, sim, da necessidade que temos de resolver os conflitos. Para isso, temos três instâncias que vão funcionar a pleno vapor. A Ouvidoria da UFU vai montar os processos disciplinares que são necessários dentro de um processo de sindicância instaurado pela comissão permanente. Existe a Copsia – Comissão Permanente de Sindicância e Inquérito Administrativo – que é fundamental. Além disso, temos de trabalhar no código de ética da instituição. Para isso, existe uma comissão nomeada. Há, sim, o Código de Ética do Servidor Público. No entanto, nossa coletividade não é composta por pessoas só ligadas à administração federal. Não é só servidor público. Temos funcionários da fundação, temos os terceirizados. E tudo isso compõe um coletivo que se chama UFU. Onde está o nosso código de ética institucional? Médico, professor, especialista em uma área de alta complexidade, a cardiologia, já foi diretor do HC-UFU, vice-reitor. O que mudou na rotina do professor Elmiro desde o dia em que soube que será o novo reitor da Universidade Federal de Uberlândia? Sou professor. Tenho uma vida acadêmica e não há a possibilidade de você fazer qualquer processo de desculpa, de não produzir, do ponto de vista acadêmico, por exercer um cargo administrativo. As instâncias que nos avaliam não querem saber disso. Como eu sempre digo: ninguém faz nada sozinho. E ainda bem que, ao longo dos anos, temos um grupo de trabalho muito grande que nos dá sustentação, que nas nossas ausências – que não são incomuns – trabalha e faz todos os procedimentos necessários, sob uma coordenação. Bem, até o momento, eu estou tocando bem a parte acadêmica – na minha forma de avaliar – recentemente, coordenei o I Fórum de Células-tronco e Terapia Celular do Triângulo Mineiro. A primeira coisa que decidi, quando saiu o resultado da consulta eleitoral, é que preciso aumentar o número de orientandos de doutorado. Mas pouca coisa mudou até agora. Tenho certeza de que as ausências serão maiores na vida acadêmica, mas é sempre possível reservar espaço para o que consideramos imprescindível, para o que gostamos de fazer. É preciso, sim, criar. A universidade tem de criar coisas novas. E essas pessoas que querem criar nós queremos que tenham todo o incentivo necessário por parte da nossa gestão. Vamos criar juntos uma forma melhor de viver. Isso é fundamental. Nós não trabalhamos por outro motivo a não ser na possibilidade de criar uma melhor condição de vida pra todo mundo. É por isso que estamos aqui. Elmiro Santos Resende É formado em Medicina pela UFU, com doutorado em Cardiologia pela Unifesp. É professor, em regime de dedicação exclusiva e atua nos cursos de Graduação em Medicina e Pós-graduação em Ciências da Saúde. É coordenador do serviço de Cardiologia do Hospital de Clínicas, do Laboratório de Medicina Experimental e do Centro de Pesquisas Clínicas da UFU. Coordena também o polo de Telessaúde, desenvolvendo ações de teleconsultorias em Atenção Básica à saúde para mais de 600 municípios mineiros. O novo reitor é um pesquisador conhecido, nacional e internacionalmente, por seus estudos em captação, processamento e transmissão de sinais elétricos celulares aplicados a sistemas de telemedicina. Reúne também uma grande experiência na administração da UFU: foi chefe do Departamento de Clínica Média, coordenador do curso de Medicina, vice-diretor do Centro de Ciências Biomédicas, Diretor Clínico do HC-UFU, e vice-reitor da UFU, no período de 2004 a 2008.

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