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Ciência

O que é e como funciona o pós-doutorado na UFU

Conheça exemplos de pesquisas sobre poluição marítima e saúde bucal da população trans

Publicado em 03/03/2020 às 15:12 - Atualizado em 22/08/2023 às 16:52

O pós-doc não é um título acadêmico, pois não é necessário defender uma tese. (Foto: Marco Cavalcanti)

Para se tornar um pesquisador ou uma pesquisadora, é preciso dispor de dedicação e tempo, pois existem várias etapas na pós-graduação. Você pode começar por cursos de especialização, com duração variável, ou pelo mestrado (acadêmico e profissional), que leva, em média, dois anos. O doutorado tem, no mínimo, quatro anos.

Entretanto, esta não é a última fase da carreira científica: o pesquisador pode ingressar em um estágio de pós-doutorado para aprimorar ainda mais as técnicas de pesquisa e trocar conhecimentos no Brasil ou no exterior. Ao final desse estágio, deve ser apresentado um relatório descrevendo as atividades realizadas. Não é necessário cursar disciplinas e nem defender uma tese. Dessa forma, o ‘pós-doc’ não é um título acadêmico.

Segundo a diretora de Pós-Graduação da UFU, a professora e bióloga Eloisa Amália Vieira Ferro, o pós-doutorado é uma forma de socialização da ciência, e imprescindível para a universidade se manter atualizada com as tecnologias de pesquisa e ensino realizadas no Brasil e no mundo. De acordo com Ferro, “o pesquisador desta modalidade é experiente e tem domínio de técnicas. Ou seja, traz uma bagagem de conhecimentos diferentes e atualizados para a nossa instituição”.

O Plano Nacional de Pós-Doutorado (PNPD) foi criado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), em 2008. Ele tem por objetivo conceder bolsas desta modalidade, por meio dos programas de pós-graduação stricto-sensu recomendados. Para esta reportagem, realizamos uma pesquisa de dados na Plataforma GeoCapes

No primeiro ano do programa havia 1131 bolsas de pós-doutorado no país. De forma gradual, o número cresceu para 7075 auxílios em 2018. No mesmo ano, havia 495 bolsas de pós-doutorado no exterior. Dessas, 114 foram destinadas a pesquisas na França, seguida pelos Estados Unidos (94), Alemanha (55) e Reino Unido (54).

Na UFU, o crescimento do números de bolsas de pós-doutorado é semelhante ao nacional. Segundo a plataforma Geocapes, a UFU obteve 679 bolsas vigentes, de 2000 a 2018. Nesse período, 2014 se destaca com 91 bolsas. Contudo, a partir daquele mesmo ano, houve um decréscimo de bolsas

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A Capes não é a única instituição que concede bolsas de pós-doutorado. Há modalidades de financiamento pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), agências estaduais de fomento e convênios entre universidades, centros de pesquisas e empresas.

Se você tem interesse em cursar o estágio de pós-doutorado, consulte editais dos programas de pós-graduação de seu interesse. Na UFU, você pode acompanhar os processos seletivos dos programas pelo site da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação.

 

O ‘pós-doc’ no exterior

 

Projetos de pós-doutorado importantes para a UFU e para a sociedade são vastos. Para esta reportagem, selecionamos duas pesquisas: um estudo sobre a poluição em ambientes marinhos e outra pesquisa que resultou em um núcleo de apoio odontológico à população transexual e travesti.

A Divisão de Afastamentos, vinculada à Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (Progep/UFU), contabiliza 96 professores envolvidos, atualmente, com o pós-doutorado, dos quais 59 realizam o estágio no Brasil e 37 no exterior. É nessa situação que se encontra a professora Jeamylle Nilin, do Instituto de Biologia da UFU, que investiga a Ecotoxicologia e a poluição em ambientes aquáticos. 

Para a professora, que desenvolve o estágio na Universidade de Aveiro, em Portugal, o pós-doutorado realizado por docentes é um estímulo para a atualização e cooperação científica. “Nesse período em que estive aqui, aprendi e me atualizei em técnicas que pretendo compartilhar com os alunos tanto nas aulas quanto na pesquisa. Acredito que todos os professores deveriam ter incentivo à capacitação, porque ela aumenta a qualidade da educação, e traz inovação para a universidade”, afirma a bióloga. 

A cientista atua em uma parceria internacional entre a Capes e a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) de Portugal. Ela escolheu a Universidade de Aveiro por ser uma instituição referência em Portugal e na Europa, inclusive na área de Ecotoxicologia. A docente já havia conhecido a universidade portuguesa no doutorado-sanduíche.

Nesta pesquisa, a bióloga estuda os efeitos danosos de substâncias anti-incrustantes em mexilhões. A bioincrustação é a fixação e o acúmulo de animais e algas em estruturas sólidas que estão no mar. Quando o fenômeno ocorre em navios, por exemplo, pode resultar em diversos problemas econômicos e ecológicos. A bioincrustação atrapalha as atividades do navio, uma vez que confere aumento do peso da estrutura, o que dificulta a navegabilidade e o equilíbrio da embarcação.

 

Amostras da pesquisa de pós-doutorado da docente Jeamylle Nilin, no Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro, em Portugal. (Fotos: arquivo da pesquisadora)

 

De acordo com Nilin, a bioincrustação em si não é problema, uma vez que é um fenômeno natural nos ecossistemas aquáticos. Porém, a bioincrustação em navios pode ser vista como uma ameaça ecológica. “Algumas espécies podem sobreviver em locais distantes da sua origem, e se tornam uma ameaça às espécies nativas. Isso causa um desequilíbrio ecológico pelo aumento da competição, e muitas vezes pela falta de predadores naturais que podem se tornar bioinvasores”, explica.

Os cientistas tentam decifrar este impasse econômico e ecológico há muito tempo. Entretanto, diversos produtos que tentam impedir a bioincrustação em estruturas artificiais, como tintas protetoras, podem ser tóxicos para outras espécies não incrustantes. É possível melhorar a eficiência das tintas anti-incrustantes causando um menor impacto ao meio ambiente?

É nesse sentido que a professora da UFU e colaboradores deste projeto estão buscando compreender os efeitos ecotoxicológicos de um novo composto que inclui nanomateriais. “Fazemos testes em espécies de clima tropical no Brasil e em espécies do clima temperado, aqui em Portugal”, afirma.

Além disso, Nilin tem planos de trazer as técnicas de pesquisa aprendidas em Portugal para Uberlândia, adaptando-as para a nossa região. “Quando eu retornar, pretendo investigar a poluição nos rios e lagos na região, em parceria com pesquisadores da UFU e outras instituições”, conclui a cientista.

 

Saúde da população trans

A UFU é o destino de pesquisadores de vários locais do Brasil e do mundo para a realização do pós-doutorado. O cirurgião-dentista Sérgio Ferreira Junior chegou à Faculdade de Odontologia da UFU em 2018, com esse objetivo, após ter concluído o Doutorado em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo, em 2017. 

O interesse do pesquisador pela UFU foi influenciado pela atuação do Centro de Referência e Atenção Integral à Saúde Transespecífica (Craist). O Craist se destaca nacionalmente pelo o acolhimento de saúde da população trans. Dessa forma, a incorporação de serviços odontológicos foi uma novidade ao Centro. Esta pesquisa inédita já foi tema de uma reportagem aqui no Comunica. 

O pós-doutorado de Ferreira é supervisionado pelo docente Adriano Mota Loyola, coordenador da Área de Patologia Bucal da Faculdade de Odontologia. Loyola diz que o contato entre os dois começou por meio de uma sugestão de uma aluna. “O Sérgio propôs um estudo epidemiológico geral e de saúde bucal de pessoas trans. A princípio, esse tema não tinha uma relação direta com a minha área (patologia). Mas, aceitei essa proposta, pois o processo de transição poderia gerar vulnerabilidades, que podem ocasionar processos patológicos”. 

Professor Adriano Mota Loyola, supervisor da pesquisa, e o estagiário de pós-doutorado Sérgio Ferreira Junior. (Foto: Milton Santos)

Loyola ressalta a importância de projetos como esse para a sociedade, uma vez que a UFU é uma instituição pública que tem compromisso com o desenvolvimento do país. Segundo ele, a atuação de Ferreira é imprescindível para a Faculdade de Odontologia na formação dos futuros profissionais. “Colocar este tema em pauta na Faculdade de Odontologia foi uma conquista. Os alunos precisam saber que essas realidades existem, para que possam atuar como profissionais de saúde”, conclui.

Dentre os resultados da pesquisa, Ferreira ressalta a criação do Núcleo de Pesquisa e Atendimento Trans (NuPAT), focado em saúde bucal. Os atendimentos começaram em outubro de 2019, com o apoio do Hospital Odontológico da UFU e de estudantes voluntários, que recebem formação e acompanhamento para atender a população trans.

A inclusão social é outra consequência do projeto, pois os pesquisadores alegam que o retorno da população trans tem sido positivo. “Preparamos os alunos para atender estes pacientes corretamente, orientamos a recepção a respeitar nomes, pronomes e identidade de gênero, para que a população trans se sinta confortável no atendimento odontológico”, conclui Loyola.

 

Colaboradores e pacientes do Núcleo de Pesquisa e Atendimento Trans (NuPAT), no Hospital Odontológico da UFU. (Foto: Reprodução Instagram NuPAT).

 

O NuPAT oferece serviços básicos da Odontologia, tais como restaurações, extrações, raspagem, limpeza etc. Aos poucos, o Núcleo estabelece parcerias com outras áreas mais específicas da Odontologia. Os atendimentos ocorrem às sextas-feiras, no bloco 4T do Campus Umuarama da UFU. Para mais informações, acesse a página do NuPAT no Instagram. O núcleo também disponibiliza o Whatsapp +55 34 9239-6545, apenas para agendamento.

 

Palavras-chave: Pós-Doutorado Ciência instituto de biologia Faculdade Odontologia

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