Publicado em 14/04/2023 às 11:35 - Atualizado em 22/08/2023 às 17:04
Antonino Martins da Silva Junior gravou entrevista para Projeto Memórias. (Fotos: Milton Santos)
Ele chegou no horário marcado. Às 16 horas de 31 de março de 2023, o ex-reitor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) Antonino Martins da Silva Junior subiu as escadas que levam à sede da Diretoria de Comunicação Social (Dirco), no Bloco 1S do Campus Santa Mônica. Com documentos, relatórios e fotografias, o professor demonstrou entusiasmo e interesse em compartilhar as lembranças dos grandes momentos que marcaram sua trajetória na UFU. Antonino é um dos primeiros entrevistados do Projeto Memórias, iniciativa da Dirco em parceria com o Curso de Jornalismo.
No estúdio, enquanto se acomodava para responder às perguntas das estudantes Ana Júlia Strano Camfella e Carolina Lemos Bernardes, o ex-reitor contou que se formou em Engenharia de Minas, em Ouro Preto (MG), em 1964, ano marcado pelo golpe que deu início à ditadura militar no Brasil. “A gente acompanhou todo aquele movimento que estava acontecendo no processo de deposição do presidente João Goulart; então, nós, os estudantes, pichamos a cidade toda – abaixo os gorilas”. O que aconteceu depois disso? “No dia seguinte, estava todo mundo preso”, disse. Esta primeira declaração, entremeada por um sorriso, já sinalizava que havia muito o que ouvir daquele mineiro nascido em Martinésia, distrito a 34 quilômetros do centro de Uberlândia (MG).
A disponibilidade de tempo para escutar o homem com idade “36 anos para 120”, como ele gosta de explicar, proporcionou momentos de riso, de choro e de aprendizado à equipe do Memórias. Filho de um escrivão e de uma professora, ele ressaltou que a única escola de Martinésia leva o nome do pai – Antonino Martins da Silva. Após retratar suas origens, o ex-reitor rememorou o trabalho como engenheiro, quando rodou o país supervisionando minas até que decidiu voltar para Uberlândia, em 1967. Nesse ano, tornou-se professor da Escola de Engenharia de Uberlândia – um dos embriões da futura UFU. “Fui contratado durante uma greve”. A fala foi seguida por uma gargalhada.
Percorrendo uma linha do tempo imaginária, Antonino recordou a criação da Universidade de Uberlândia (UnU), em 1969. Explicou que, a partir desse marco, foi necessário ampliar o número de cursos e de vagas, além de implementar o regime de matrícula por disciplina e o sistema semestral. “Quem inventou tudo isso é o artista que vos fala”, brincou.
A federalização da UnU, que passou a se chamar Universidade Federal de Uberlândia (UFU), em 1978, teve consequências imediatas e gerou algumas situações inusitadas. “A UFU foi a primeira universidade federal que ainda cobrava anuidade dos alunos, com exceção dos estudantes de Engenharia. Resultado: greve!”. A situação de desigualdade durou menos de um ano. A partir desse processo, houve a organização dos cursos em três centros: Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas (Cetec), Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (Cehar) e Centro de Ciências Biomédicas (Cebim). Antonino afirmou que, nesse momento, sua grande contribuição foi elaborar o plano de carreiras para professor. “Fiz a melhor tabela de salário do Brasil porque precisava atrair profissionais”, declarou.
Durante a entrevista de quase duas horas, o professor rememorou os tempos em que, na UFU, foi assessor de ensino, diretor da Escola de Engenharia, vice-reitor, pró-reitor acadêmico e, finalmente, assumiu o cargo de reitor - tendo ficado nele de 1988 a 1992. Por um período de três anos, esteve fora da UFU, quando foi convidado a construir o campus da Universidade de Rondônia. No norte do país, colocou em prática a ideia de multicampus, uma inovação para a época. “Nós somos pra frente”, resumiu.
Ao descrever os bastidores da criação de uma universidade, Antonino revelou episódios como a confusão provocada quando decidiram que alunos de Letras ocupariam o mesmo prédio dos estudantes de Engenharia. Relembrou decisões administrativas que o colocaram em risco, quando sua casa de Uberlândia foi apedrejada, e as ameaças de morte sofridas em Rondônia. Divertiu-se ao lembrar que, provavelmente, foi ele o criador da “Semana do Saco Cheio” - feriado prolongado, embora não seja recesso oficial, que une as comemorações da homenagem à Nossa Senhora Aparecida (12 de outubro) e o Dia do Professor (15 de outubro). "Não tenho certeza, mas me lembro muito bem que era eu que fazia os horários acadêmicos e, como o regime semestral era pesado, eu sugeri para aproveitarmos os feriados do mês de outubro para termos uma semana de recesso", comentou. Pelo menos na UFU, o professor acredita que foi ele quem implantou a dinâmica do descanso.
Durante o depoimento, o ex-reitor chegou a se emocionar. “Eu estive lá”- esta foi a frase que o professor utilizou para finalizar os esclarecimentos sobre cada etapa da criação e consolidação da UFU. Celebra como grande contribuição como reitor a instalação das bibliotecas. “A UFU foi a minha vida”, afirmou o senhor de 84 anos. "Eu costumo dizer para os meus netos que, na vida, é preciso ler, ler muito, observar, e ter comportamento ético”, enfatizou, acrescentando uma preocupação que sempre teve: "Temos de gerir um bem público sem nos contaminar; assim, todas as minhas contas foram aprovadas." Por fim, Antonino fez uma reflexão sobre sua missão e reproduziu os ensinamentos deixados pelo filho, que faleceu recentemente: “Ao final da vida, você pode falar que batalhou a boa batalha e venceu o combate.”
Memórias
O Projeto Memórias busca reconstituir a história da UFU, por meio de conteúdos jornalísticos. Segundo o historiador francês Antoine Prost, autor do livro Doze lições sobre a História, é possível empreender uma meditação retrospectiva sobre a fecundidade própria do tempo, sobre o que ele faz e desfaz. O tempo é o principal ator da história. As entrevistas realizadas pelo Memórias são conduzidas por estudantes do Curso de Jornalismo, integrantes do Projeto UFocas, sob coordenação da jornalista Renata Neiva e supervisão do técnico em audiovisual Lucas Melo. O projeto conta com o apoio do fotógrafo Milton Santos, considerado pela equipe o "embaixador de Memórias", e de duas representantes da Divisão Administrativa da Dirco, Fabiana Nogueira e Hellen Caetano. A proposta é que o material contribua para fortalecer a identidade institucional. Os canais de divulgação das entrevistas serão definidos pela equipe da Dirco.
Estudantes de Jornalismo, Carolina Lemos Bernardes (à esquerda) e Ana Júlia Strano Camfella (à direita) conversaram com o ex-gestor da UFU
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