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Pesquisa

Estudantes são indicadas para premiação na área de Diversidade no maior Congresso de Contabilidade da América Latina

Alunas do Programa de Pós-graduação em Ciências Contábeis representarão a UFU no USP International Conference on Accounting

Publicado em 27/07/2023 às 12:38 - Atualizado em 22/08/2023 às 16:38

O evento anual é considerado o maior da América Latina. (Foto: mindandi/Freepik)

Considerado o maior evento de pesquisa e extensão em Contabilidade e Atuária da América Latina, o 23º USP International Conference On Accounting acontece entre 26 e 28 de julho, em São Paulo-SP. O congresso, que conta com palestras, debates e oficinas, terá estudantes representando a Universidade Federal de Uberlândia (UFU) na apresentação de dois trabalhos.

Akira Aikyo Galvão e Juh Círico integram o Programa de Pós-graduação em Ciências Contábeis (PPGCC/UFU). As discentes foram indicadas para a premiação na área de Diversidade nas organizações com dois trabalhos. Casadas há seis anos, se vêem como uma dupla de pesquisa e de apoio.

Akira Galvão (na esquerda) e Juh Círico (na direita) são pioneiras no PPGCC. (Foto: Arquivo Pessoal)

"Resistir, Rememorar e Ressignifica"

O artigo “Resistir, Rememorar e Ressignificar: Uma Autoetnografia de um Corpo Trans Nãobinárie e Autista na Contabilidade” foi desenvolvido pelas pós-graduandas. Galvão relata que a proposta da pesquisa refere-se a contar as suas vivências. “No programa de pós-graduação que estou inserida, eu sou a primeira pessoa trans nãobinárie, mas eu também sou uma pessoa autista. Então, esses dois recortes acabam interagindo sobre como eu sou vista tanto no programa quanto nos eventos que eu participo”, comenta.

Ainda destaca que o trabalho é um relato sobre sua vida, que começa na infância até o primeiro contato com as Ciências Contábeis e a carreira que escolheu. Sobre sua vivência na pesquisa, considera que iniciou como uma provocação: “O que aconteceu foi que eu não me via na pesquisa. Quando nós pensamos em alguém que faz pesquisa, que vive a ciência, nós temos aquela imagem do homem branco, cigênero, heterossexual, sem deficiência, com terno ou jaleco dentro de um laboratório, e a gente não conseguir se ver, ou seja, não ter essa representatividade, é complicado nós nos visualizarmos nesses espaços”.

No mundo da pesquisa, Galvão se vê como alguém que foi provocando os espaços pelos quais passava, trazendo temáticas diferentes das estudadas na área da contabilidade. “O desafio é sempre ser a primeira a chegar nesse lugar”, complementa. Assim, chega ao seu primeiro congresso com um trabalho que conta sobre si. Apesar de ser um evento que promove a difusão de conhecimento e interação com a sociedade, a cientista tem receio de como será a recepção da comunidade acadêmica.

“Enviar para o congresso USP, um grande evento, e ser aprovado já havia sido uma grande conquista. Mas, no caso de ter um trabalho que fala sobre o antes da pesquisa, ou seja, como eu cheguei até a pesquisa, como conheci, o primeiro contato com a universidade e até mesmo a primeira passagem pelo portão da Universidade, e a partir do momento que eu consigo construir uma narrativa que, para que haja uma pessoa que pesquisa, existe uma vida antes da pesquisa, é poder dizer que há vidas na pesquisa”, destaca. Para a cientista, não se deve considerar apenas o ato de pesquisar, mas também quem realiza aquele trabalho.

"Pessoas Trans e Travestis em Organizações Brasileiras"

Já o artigo “Pessoas Trans e Travestis em Organizações Brasileiras: Desafios e Possibilidades”, é fruto da tese de doutorado de Juh Círico, orientada pela professora Marli Auxiliadora da Silva, da Faculdade de Ciências Contábeis (Facic/UFU), que refere-se às transvivências na contabilidade.

Por ser a primeira publicação do doutorado, a pesquisadora resolveu direcionar o trabalho para um âmbito geral das organizações brasileiras e do mercado de trabalho, avaliando o processo de pós-admissão de pessoas trans e travestis. Através de uma revisão integrativa da literatura e de pesquisas que usam entrevistas, Círico coletou relatos para entender a trajetória, desafios, percursos e percalços vivenciados por essas pessoas.

"Os resultados demonstraram que a gestão da diversidade nas empresas brasileiras é pensada e construída voltada apenas para pessoas LGB cisgêneras, não para pessoas transgêneras, pessoas trans e travestis", comenta. Com isso, a pesquisadora salienta que a gestão de diversidade é, em muitos estudos, chamada de “diverCISdade”, ou seja, voltada apenas para pessoas cisgêneras.

Ela ainda destaca que o preconceito sofrido pelas pessoas trans e travestis dentro das organizações faz com que a pessoa deixe o emprego: “Ela não se sente acolhida, ela não tem nem seus pronomes respeitados dentro da organização, não há um acolhimento em relação ao uso do banheiro, a questão do uniforme, de modo que ela possa se sentir confortável ali naquele espaço”.

Com isso, Círico considera que o artigo é uma provocação aos projetos de diversidade e inclusão das empresas, buscando que estas repensem sua gestão para que possam realmente acolher as pessoas trans e travestis.“Quando não há políticas voltadas ao acolhimento e pensando no pertencimento dessas pessoas dentro das organizações, há um movimento de expulsão”, ressalta.

A pesquisadora reforça que, para além da contratação, também é necessário pensar na permanência: “Atualmente, ainda em 2023, 90% das pessoas trans e travestis, especificamente mulheres trans e travestis, estão na prostituição porque há preconceitos dentro da cultura das empresas e que não as contratam por transfobia. Então a prostituição não é uma escolha, é a única alternativa para sobreviver num país em que mais mata pessoas trans e travestis pelo 14º ano consecutivo, de acordo com Associação Nacional de Travestis e Transexuais, a Antra”.

Em seu artigo, informações como a de que apenas 0,02% da comunidade trans e travesti está no ensino superior e que a expectativa média é de essas pessoas sejam expulsas de casa aos 13 anos de idade, aparecem como contraponto a necessidade de revisar os espaços sociais e no mercado de trabalho que excluem essa parcela da população.

“Quando eu falo em desafios e possibilidades é porque ‘desafios’ são a realidade que pessoas trans e travestis enfrentam dentro das organizações quando raramente são contratadas. As ‘possibilidades’ são um convite para empresas e também para cursos de ensino superior pensarem na nossa inclusão e pensarem na nossa permanência nesses espaços, com acolhimento e respeito”, completa.

A diversidade no mundo da pesquisa

Juh Círico relata que os estudos desenvolvidos pela dupla vão contra a norma das pesquisas em contabilidade, normalmente quantitativas. Para Akira Galvão, a área, tanto na prática profissional quanto na pesquisa, é muito focada em números. “Quando nós começamos a falar de pessoas e não de dinheiro, a gente começa a perceber que há um grupo de pessoas que estão interessadas em falar ‘ok, vamos pensar nas vidas para além da contabilidade’”, completa.

Sobre a continuidade da pesquisa, Galvão ressalta que é necessário que pessoas trans falem sobre si, pois é a oportunidade de abordar sua realidade. “Quando nós nos expressamos e falamos ‘nós somos pessoas trans, nós pesquisamos, nós estamos aqui, nós produzimos ciências, nós podemos ser premiadas’. Há possibilidade de ciência também com corpos trans, nós podemos nos representar e falar por nós mesmas”, afirma.

A proposta é ampliar a parceria em futuras pesquisas para que pessoas cisgêneras também pensem na diversidade juntamente com pesquisadoras e pesquisadores trans. Para Círico, a indicação para o prêmio da USP International Conference On Accounting comprova que “nós chegamos para ficar”. E deixa uma exortação: “Nós queremos fazer um convite aos pesquisadores e pesquisadoras da área para que também possam pensar para além dos números, [pensar] nas vidas, nas características, para repensarem no seu meio”.

As apresentações acontecem em 27 de julho, das 10h20 às 10h50, e em 28 de julho, das 10h50 às 11h20.

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Palavras-chave: contabilidade diversidade PPGCC

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