Publicado em 24/02/2022 às 08:37 - Atualizado em 01/09/2023 às 10:27
Padre Cícero, 88 anos após a sua morte, ainda movimenta fiéis por todo o Brasil e carrega consigo uma polêmica trajetória marcada pela política e a religiosidade
Naquela noite de 1872, um ano após se tornar padre e fazer sua primeira visita a Juazeiro do Norte (CE), Cícero dormia sob a lua de sua terra natal, Crato (CE). O homem de Deus, que retornara para a casa de sua mãe e lecionava aulas de latim enquanto aguardava que lhe destinassem uma paróquia, talvez não imaginasse que seu nome e suas ações se tornariam conhecidos para além daquelas terras após receber uma visita que, segundo ele, era o próprio Cristo.
O que foi descrito por José Comblin, teólogo, sacerdote e missionário belga, é que Padre Cícero viu adentrar no quarto em que dormia o próprio Sagrado Coração de Jesus. Rodeado pelos 12 apóstolos, quando Jesus iria começar a falar, uma multidão de retirantes tomou conta do local. Segundo Comblin, o filho de Deus voltou-se para Cícero e disse: “Você, Padre Cícero, tome conta deles!”.
Depois do acontecido, como enviado divino e destinado a guiar o povo de Juazeiro, o homem mudou-se para Juazeiro junto de sua mãe e irmãs, onde começou a atuar como padre e a trazer melhorias para a cidade. Ao longo de sua vida, regada de acontecimentos divinos, contrastada com conflitos sociais, políticos e religiosos, a figura de Padre Cícero tornou-se emblemática, movendo anualmente pesquisadores e devotos às regiões onde ele atuou.
O ponto de virada da vida de Padre Cícero aconteceu no dia 6 de março de 1889, durante a quaresma. Após clamar a Deus para que os efeitos da seca diminuíssem, a beata Maria de Araújo, ao receber o “corpo de Cristo”, sentiu gosto de sangue em sua boca. Informando o acontecido ao padre, ele guardou a hóstia em um pano que passou a atrair milhares de fiéis que vinham adorá-lo.
Para além de sua fama religiosa, o sacerdote também efetuou melhorias no município de Juazeiro do Norte, tornando-se uma figura notável.
Em busca de homenagear seu lugar de origem, Boca da Mata (AL), em seu trabalho de conclusão do curso de Geografia na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Campus Pontal, o graduando Walisson Torquato - orientado pelo professor Anderson Portuguez, do departamento de Geografia da UFU de Ituiutaba - viu sua história ser, de certa forma, entrelaçada com a de Cícero Romão Batista. O trabalho, que foi homenageado pela Câmara de Vereadores da cidade de Boca da Mata, busca analisar os aspectos religiosos e políticos que marcaram a vida de Batista, assim como as contribuições geográficas que ele trouxe para o Ceará, Alagoas e Minas Gerais, graças ao turismo religioso.
Para o pesquisador, o reconhecimento do trabalho pela Câmara é importante para que toda Alagoas conheça a força da fé dos seguidores do Padre Cícero no município, tornando a região semelhante à própria Juazeiro do Norte. Isso pode contribuir para a economia de Boca da Mata, levando romeiros e outros pesquisadores do assunto para o local.
Tendo vivido em uma época com uma forte atuação coronelista, estudiosos como Torquato promovem uma revisão crítica da história de Cícero, trazendo evidências da vida política do padre, que é marcada por um perfil manipulador, característico dos coronéis do Nordeste brasileiro da primeira metade do século XX. Polêmico desde o período em que estudava para ser padre, Batista aproveitou da fé para ganhar dinheiro, confiança política e eleitores em Juazeiro e fora do Estado do Ceará, como foi evidenciado ao longo da pesquisa de Torquato.
Proibido de exercer suas funções eclesiásticas, devido aos acontecimentos que desagradaram os membros da igreja, Cícero iniciou sua caminhada política sendo eleito o primeiro prefeito de Juazeiro, ficando no cargo por 12 anos.
A fé, difundida pelos seguidores de Padim Ciço, espalhou-se por todo o Brasil e permanece forte até os dias de hoje, principalmente nos estados do Ceará, Alagoas e Minas Gerais, mesmo havendo estudos que questionam a credibilidade do sacerdote. De acordo com o graduando em Geografia, sua pesquisa pode ser ainda mais aprofundada por outros que desejam mergulhar na história do padre, principalmente no que tange sua vida religiosa.
“Descrevo Cícero como um grande influenciador, piloto e religioso. Autoridades que defendem seu nome na política ou na igreja católica, podem ganhar qualquer coisa por meio de seus adoradores. É impressionante o que os devotos do padre são capazes de fazer em seu nome, principalmente em Juazeiro ou em Boca da Mata”, finaliza Torquato.
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Palavras-chave: Religiosidade juazeiro Geografia padre cícero Centro de Tecnologias para Pessoas com Deficiência e Doenças Raras
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