Acessibilidade e inclusão nas universidades

Do ingresso à saída, circulando entre os blocos da universidade, milhares de alunos experimentam, todos os dias, as nuances da vida acadêmica. Mas, o que na teoria deveria ser um espaço universal, nem sempre alcança a todos, nem em igualdade ou mesmo em justiça. Essa realidade é refletida, por exemplo, no despreparo das escolas superiores ao acesso de pessoas com deficiência. 

Ser acessível é, por lei, oferecer igualdade de oportunidades físicas e intelectuais. Mas quando a lei não salta do papel para a prática, o que observamos é um número cada vez maior de universitários desassistidos. Barreiras físicas, comunicacionais, metodológicas, políticas e comportamentais são os pontos trabalhados pelo pesquisador Matheus Silva Souza, mestre em Ciências Contábeis pelo Programa de Pós-graduação em Ciências Contábeis (PPGCC/UFU), da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). 

Souza abordou o tema em um artigo, publicado pela revista Education Policy Analysis Archives (EPAa), da Universidade do Estado do Arizona, nos Estados Unidos, em outubro de 2023, intitulado “Acessibilidade e inclusão na graduação em ciências contábeis: Uma discussão acerca do conhecimento e envolvimento”. O texto é resultado da investigação realizada em seu curso de mestrado.

Segundo o pesquisador, o tema faz parte de sua trajetória. Antes da graduação, já havia trabalhado como professor de informática na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), de Santa Vitória (MG), por três anos. Já na graduação, trabalhando como monitor e atendendo a uma aluna surda, descobriu sua vocação para a docência. “Percebi que os alunos que atendia estavam se desenvolvendo bem nas disciplinas, e isso me inspirou a continuar”, afirma. Então, com o trabalho de conclusão de curso (TCC), entrou de vez no tema incomum para as Ciências Contábeis. 

Investigando sobre a inclusão e a acessibilidade nos cursos de graduação em Ciências Contábeis nas universidades federais de Minas Gerais, Souza prosseguiu com a pesquisa na pós-graduação, entre 2020 e 2022, dando origem ao artigo. 

Tratando justamente dos pontos primordiais abordados na dissertação, o autor destaca que a falha de comunicação entre setores da universidade, a falta de formação específica para cursos de licenciatura e as metodologias de ensino e os materiais para estudo sem adaptação correta impactam na vida dos alunos com deficiência.

Segundo o Censo da Educação Superior de 2022, em dez anos houve um crescimento do número de matrículas em cursos de graduação de alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação. Foram mais de 20 mil, em 2012, para quase 80 mil em 2022, indicando uma maior ação das políticas públicas voltadas à inclusão. Com a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), vigorando desde 2015, percebe-se que a recente legislação vem, aos poucos, garantindo a inclusão social e cidadã, promovendo a igualdade, liberdade e os direitos das pessoas com deficiência.

Tudo isso, para Souza, auxilia na busca por melhorias que ainda precisam acontecer:  “ainda tem muito que pode ser melhorado em questão da dimensão, da acessibilidade física, metodológica e comunicacional”. Falhas na formação e adaptação da linguagem pelos docentes, com termos técnicos sem sinais convencionados para Libras, por exemplo, foram detectados na pesquisa, que teve participação de professores, alunos, coordenadores e direção acadêmica do curso de Ciências Contábeis da UFU.

O pesquisador relata o caso de uma aluna surda que deixou o curso após ser orientada a escrever seu TCC em português, língua que não domina. Para os surdos a língua portuguesa, em sua modalidade escrita, é redigida de maneira diferente, sendo o aprendizado das normas cultas comparada a alfabetização de uma nova língua. 

O desencontro entre ensino e aprendizagem, são o reflexo do curto caminho traçado para a acessibilidade. Neste trajeto, outro problema experimentado pelo autor do artigo foi a carência de materiais acadêmicos sobre o tema. As dificuldades começaram logo no início da pesquisa, com a ausência de materiais sobre deficiência na área da contabilidade. Assim, ele teve que buscar textos internacionais da área. 

Para que outros pesquisadores não precisassem passar pelos contratempos da falta de bibliografia, o pesquisador e Marli Auxiliadora da Silva, orientadora da pesquisa e professora do Programa de Pós-graduação em Ciências Contábeis, tiveram a ideia de publicar os resultados da pesquisa de mestrado de Souza, como artigo.

A publicação em uma revista internacional de educação, a Education Policy Analysis Archives, ocorrida em outubro de 2023, contribui, também, para promoção e a reflexão do tema na contabilidade. Além da divulgação, o material inclui recomendações práticas para que universidades se tornem ainda mais inclusivas, como oficinas e palestras no início dos semestres, aquisição de bibliografia em libras e braile e formação continuada para professores. As recomendações e o trabalho completo estão disponíveis no repositório.

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