A virtualidade real

Recentemente, foi muito compartilhada na internet a imagem de uma jornalista que aparentemente entrevistava um homem acidentado. Na foto o rapaz estava preso ao para-brisa de um carro, coberto de sangue, e a repórter apontava o microfone em sua direção. A imagem foi alvo de vários comentários nas redes sociais, principalmente criticando a repórter pela atitude. Mais tarde, soube-se que a foto foi tirada quando a jornalista Lanna Coelho estava cobrindo uma simulação de acidente de trânsito para a TV Equinócio, afiliada da Record no Amapá. De acordo com o professor, escritor e roteirista de histórias em quadrinhos, Ivan Carlo, a perpetuação de boatos como se fossem realidade é um dos efeitos da virtualização, processo no qual “Cada vez mais as pessoas não conseguem diferenciar o real do ficcional”, afirma.

Ivan esteve na UFU, em dezembro (05/12), apresentando a Palestra, “A virtualidade real: quando as pessoas não conseguem mais distinguir realidade de ficção”. De acordo com ele, a aproximação entre real e virtual pode gerar tanto situações em que um fato inventado é considerado verdadeiro, como aconteceu no famoso caso do radialista Orson Welles, que gerou pânico em 1938, ao narrar uma adaptação da obra de ficção “Guerra dos Mundos”, fazendo os norte-americanos acreditarem em uma invasão alienígena. O inverso também é possível, situações em que fatos verdadeiros são confundidos com ficção, “Por exemplo, o 11 de setembro que todo mundo achou que era falso, tanto que, na França teve que ter a legenda: "Isso não é ficção”, conta.

Um dos fatores que contribuíram para o processo de virtualização é a grande adesão às redes sociais. Nesse aspecto, Ivan ressalta o hábito dos usuários de reproduzirem informações sem checarem a veracidade. Até mesmo os veículos jornalísticos podem publicar informações falsas que são assimiladas como verdadeiras pela população. Dentro dessa questão, um ponto importante é a responsabilidade dos jornalistas na apuração dos fatos, visto que a imprensa tem um grande poder de legitimação na sociedade, aponta Ivan.

A mistura entre verdade e ficção também pode ser uma estratégia utilizada pela mídia, um exemplo citado por ele, foi o último reality show Big Brother Brasil, exibido em 2014, que teve a participação de uma personagem fictícia, a Valdirene. Sua participação no programa foi produzida para estar o mais próximo da experiência de um participante real. O hiper-realismo é um dos fatores que tem tornado a ficção cada vez mais crível para a sociedade. As histórias estão cada vez mais complexas, imagens e jogos criados digitalmente para parecerem super-realistas. A ficção cada vez mais é trabalhada para transmitir realidade.

Na opinião de Ivan, a virtualização é um caminho sem volta e que tende a intensificar, cada vez mais. Para ele, o melhor a se fazer no momento é trazer o tema para a discussão, nos cursos de jornalismo e na sociedade “Mais do que nunca a gente tem que discutir essas questões” afirma.

Ivan Carlo ou Gian Danton

Ivan Carlo tem formação acadêmica em Jornalismo e atualmente é professor na Universidade Federal do Amapá, atuando principalmente com quadrinhos, jornalismo e literatura de fantasia. Gian Danton é o pseudônimo criado por Ivan Carlo e é com ele que assina seus trabalhos, livros, roteiros de histórias em quadrinhos e textos. O nome veio da junção dos nomes do pintor renascentista Gian Bellini e do político francês Georges Jacques Danton, figura importante da Revolução Francesa. A carreira no mundo dos quadrinhos teve início com a história Floresta Negra, desenhada por Bené Nascimento. Seu trabalho considerado mais conhecido na área de quadrinhos foi a graphic novel Manticore, história baseada na lenda do chupa-cabra com o estilo influenciado pelo seriado Arquivo X, e outras obras de ficção científica. A revista conquistou os prêmios Ângelo Agostini, HQ Mix e o Prêmio Nova da Associação Brasileira de Arte Fantástica. Atualmente, escreve para uma coluna no site Digestivo Cultural. Mais informações sobre o trabalho de Gian Danton no seu Blog.