Publicado em 23/04/2019 às 09:12 - Atualizado em 22/08/2023 às 16:56
Algumas das coletas mais antigas de plantas estão em herbários internacionais e esse foi um dos motivos do interesse de Vanessa Terra na pesquisa realizada em Nova York. (Foto: Arquivo do pesquisador)
O corte de verbas na área da pesquisa no ambiente acadêmico interfere diretamente no desenvolvimento da ciência nas universidades. Esse é o quadro em que se encontrava a professora Vanessa Terra, do Instituto de Ciências Agrárias do Campus Monte Carmelo da Universidade Federal de Uberlândia (UFU).
Doutora em Botânica, a docente realizava pesquisas em taxonomia de espécies de plantas, no entanto, em virtude da escassez de recursos, os trabalhos foram paralisados, enquanto ela aguardava uma oportunidade para continuação. E foi através do edital “Rupert Barneby Award” que Terra enxergou a chance de prosseguir com os estudos.
A pesquisa intitulada “Flora do Brasil: revisão de espécies do gênero Senegalia com ênfase no complexo S. polyphylla” foi submetida para avaliação em agosto de 2018 e, em dezembro do mesmo ano, foi notificada como a mais bem classificada junto de outras sete pesquisas de todo o mundo. A premiação consistiu em um financiamento para o desenvolvimento do projeto no Jardim Botânico de Nova York.
A pesquisa
A taxonomia é a ciência que lida com a descrição, identificação e classificação dos organismos, individualmente ou em grupo. No doutorado, Terra trabalhou com o gênero de legumes chamado Senegalia, conhecido pelo nome popular “arranha gato”. O enfoque do estudo foi verificar quantas espécies ocorrem no Brasil, em quais biomas e quais necessitavam de mais cuidados para conservação por estarem ameaçadas de extinção; e entender, através da biologia molecular, o parentesco entre essas espécies com as Senegalias que ocorrem fora do país.
A pesquisadora, no entanto, percebeu que não haveria tempo suficiente para se dedicar à identificação de tais complexos de espécies no doutorado e essas questões ficaram por serem respondidas. O assunto voltou a ser tema de estudo quando a professora iniciou a co-orientação de pesquisa de pós-graduação do aluno Flávio Antônio Zagotta Vital, da Universidade Federal de Lavras (UFLA). O estudante começou a desenvolver sua tese com o complexo S. polyphyla, trabalhando com anatomia (morfologia interna das folhas) e morfometria (medidas externas de folhas e flores).
A morfometria ajuda, de forma estatística, a identificar espécies dentro de um grande complexo. (Foto: Arquivo da pesquisadora)
Ao longo do processo de orientação, Terra percebeu que, das seis espécies presentes no complexo, cinco poderiam ser analisadas por meio de materiais presentes em herbários (uma espécie de museu de plantas secas) no Brasil. Uma delas possuía depósito apenas em herbários nos Estados Unidos.
Daí veio a ideia de submeter o trabalho ao edital “Rupert Barneby Award”. A pesquisadora conta que, em meio às incertezas sobre levar a pesquisa adiante em virtude da escassez de recursos, ficou sabendo da oportunidade através de um de seus colaboradores. “Meu co-orientador de doutorado, o doutor Joseph Thomas Miller, me mandou um e-mail dizendo: ‘Olha, Vanessa, tem esse edital aberto que disponibiliza um valor financeiro para uma visita ao Jardim Botânico de Nova York para desenvolver um projeto por duas semanas’”.
O edital era destinado a pesquisadores que trabalhavam apenas com taxonomia de legumes. Depois de enviar o trabalho para avaliação e receber o resultado final, a cientista se programou para ir em março deste ano, entre os dias 7 e 22, realizar as análises e os estudos. A premiação poderia ser utilizada em qualquer período de 2019, desde que contemplasse o prazo de realização da pesquisa de duas semanas.
No herbário do Jardim Botânico de Nova York, Terra teve acesso aos arquivos de plantas do gênero Senegalia. “Fiquei fazendo a morfometria, medindo as características das folhas e das flores, de todas as estruturas”, explica. “Lá consegui medir cerca de 50 plantas e ampliar a tabela que possuía 27 caracteres para 43, gerando uma base de dados bastante densa e importante para finalizar as análises que estávamos fazendo”, complementa.
Além do trabalho de análise e morfometria, a pesquisadora ainda organizou, corrigiu e atualizou o acervo de gênero Senegalia. “Junto com alguns pesquisadores dos Estados Unidos, com quem colaboro há algum tempo, descrevemos dois gêneros novos para esse grupo: a Parasenegalia e a Pseudosenegalia, que aumentaram a necessidade de atualização da coleção do Jardim Botânico de Nova York”.
O prêmio “Rubert Barneby Award” é uma homenagem ao pesquisador que trabalhou durante muito tempo com família das leguminosas e com taxonomia.
Cerca de 50 espécimes de plantas do gênero Senegalia tiveram suas características medidas e registradas. (Foto: Arquivo da pesquisadora)
Contribuições para a sociedade
Para a pesquisadora, a experiência de ter realizado o trabalho e a pesquisa no Jardim Botânico de Nova York, um dos maiores herbários existentes, trouxe frutos válidos não só para o presente, mas também para o futuro. “Eu estava com as minhas pesquisas estacionadas, sem conseguir avançar muita coisa. Então, além da ajuda financeira, a oportunidade de ir até lá me proporcionou um contato profissional maravilhoso, porque fiz muitos contatos que vão me dar suporte para pesquisas futuras que estou desenvolvendo com outros grupos de plantas, com outros complexos de espécies”, destaca.
Além disso, Terra entende que a contribuição que a realização do trabalho deixa é a de que é preciso “conhecer para conservar o máximo possível a nossa fauna e flora”. “Na taxonomia, a gente trabalha com identificação e nomenclatura de plantas e nós partimos do princípio: como podemos conservar o que não conhecemos? Impossível. Para conservar a gente precisa conhecer as espécies para podermos traçar estratégias de conservação, afinal não posso conservar espécies que eu não conheço”, finaliza.
Palavras-chave: Taxonomia; Herbário; Senegalia; Pesquisa Científica; Prêmio;
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