Publicado em 19/06/2019 às 09:42 - Atualizado em 22/08/2023 às 20:33
Imagem: Divulgação
O Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (Neab), em parceria com a Pró-Reitoria de Graduação (Prograd/UFU) e com a Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Federal de Uberlândia (Propp/UFU), organiza o I Encontro de Formação das Comissões de Heteroidentificação que acontece nos dias 28 e 29 de junho no Campus Santa Mônica.
O evento tem como objetivo compreender as especificidades do racismo e as noções de raça/cor no Brasil, além de discutir a compreensão desses assuntos na sociedade e apresentar o histórico da autodeclaração racial no contexto brasileiro. Com o intuito de formar um grupo de agentes interessados em participarem das comissões de heteroidentificação da UFU.
Na atividade de abertura, a promotora de justiça do Ministério Público do Estado da Bahia (MPBA) e coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Proteção dos Direitos Humanos e Combate à Discriminação (GEDHIS), Lívia Maria Santana e Sant'Anna, apresenta a conferência “Políticas de Ações Afirmativas e Heteroidentificação no Brasil”.
Haverá também uma mesa redonda sobre políticas públicas e ações afirmativas, traçando a trajetória destas no Brasil e que será composta pela diretora de políticas de ações afirmativas e estudantis da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Daniely Roberta dos Reis Fleury e pelo professor Leonardo Barbosa do Instituto de Ciências Sociais da UFU. As inscriçoes podem ser feitas online. Confira a programação completa:
O que é “heteroidentificação”?
A palavra “heteroidentificação” é, de fato, nova no vocabulário brasileiro. Seu significado é atrelado ao radical ‘hétero’ que está relacionado à diferença, ou seja, identificação complementada por diferentes pessoas. Explicando melhor, o processo de ingresso em universidades e concursos públicos por meio de cotas tem sofrido com fraudes de candidatos que se autodeclaram pretos, pardos ou indígenas na hora de se inscrever para os processos seletivos.
A prática da heteroidentificação se fez necessária para combater essas fraudes, que atualmente são o principal fator prejudicial à efetividade das cotas raciais para a entrada dessas etnias nas universidades. Com a adoção dessa nova forma de fiscalização, conquistada pelo posicionamento determinante do movimento afrobrasileiro no combate às fraudes, os candidatos que se inscreverem usando as modalidades de cota racial deverão se apresentar para bancas compostas por comissões formadas por membros dos coletivos negros das próprias universidades e por pessoas pertencentes a entidades civis ligadas aos movimentos negros.
Para assegurar que os candidatos que ingressarem por meio das vagas reservadas às cotas sejam pretos, os membros da comissão devem passar por curso preparatório que apresente os procedimentos de heteroidentificação. A apresentação do candidato deverá ser gravada para que, em caso de discordância por parte do candidato com o veredito da banca, a análise possa ser reavaliada por outra banca conforme o candidato entre com recurso.
Lei de Cotas
Desde agosto de 2012, o Governo Federal aprovou a Lei nº 12.711, conhecida como Lei de Cotas, que garante a reserva de 50% de suas vagas para cotistas, divididos em modalidades que abrangem alunos oriundos de escolas públicas, com vulnerabilidade social e pretos, pardos e indígenas.
O I Encontro de Formação das Comissões de Heteroidentificação - UFU abordará a fundo a prática da heteroidentificação, suas justificativas e o funcionamento do sistema de reserva de vagas para negros e indígenas (PPI) nos processos seletivos da UFU. Abaixo você confere imagem com a programação detalhada do evento.
Formação das comissões
A diretora de políticas de ações afirmativas e estudantis da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Daniely Roberta dos Reis Fleury, falou ao Comunica sobre como é feita a preparação dos participantes do curso:
“A preparação é, antes de tudo, uma troca de experiências e um resgate do que se trata essa política pública, qual sua finalidade, o objetivo da reserva de vagas e, a partir disso, vamos construindo os elementos e quem são as pessoas que são sujeitos ou público-alvo da política de ações afirmativas que reserva vagas no ensino superior para pessoas negras. É um momento de formação. Iremos desenvolvendo como uma didática, e até como uma troca de ideias e de percepção, [para entendermos] elementos fenotípicos - não se considera a ascendência. Avaliamos o critério fenotípico, como, o que é o fenótipo, se ele é considerado de forma isolada ou de forma conjunta”, explica Fleury.
Todos esses aspectos do curso são feitos com embasamento jurídico para segurança das comissões e também dos candidatos, como complementa Fleury em sua fala:
“Nós trazemos as informações da legislação, das jurisprudências, tudo para que as comissões se sintam seguras para fazer esse procedimento”, afirma. Fleury também reforça o compromisso do Ministério Público com esse mecanismo:
“Hoje aqui tivemos a presença da Doutora Lívia [Vaz] do Ministério Público da Bahia que veio reforçar esse compromisso institucional do Ministério Público e da necessidade de mecanismos que proporcionem a efetividade da política, como é o procedimento de heteroidentificação”.
Daniely Fleury também falou sobre os casos de fraude e sobre como a heteroidentificação promove a efetividade dessa política pública:
“Eu entendo de duas formas [os casos], sobretudo, compreendendo que nem tudo é fraude. Tem sim, em alguns casos, o intuito de ludibriar - o que vai caracterizar fraude - mas às vezes não. Independente se é fraude ou não, o fato é que a política pública tem um ciclo de implementação e ela precisa ter mecanismos que promovam efetividade.
A heteroidentificação está longe de ser qualquer mecanismo expositório. Ela é, na verdade, uma garantia, mais um mecanismo, que garante a efetividade da política”, ressalta a diretora.
Sobre a autodeclaração dos candidatos, critério utilizado anteriormente nos processos, Fleury reconhece a importância e aponta que a comissão existe apenas para complementar essa afirmação:
“A heteroidentificação no caso, o conceito quer dizer ‘outro’, em complementação à autodeclaração. Reconhecemos a importância de se autodeclarar, mas também dentro desse contexto precisamos de mecanismos que deem efetividade à autodeclaração. Esses mecanismos já foram inclusive apontados, que poderiam ser possíveis, desde o julgamento de constitucionalidade das cotas, da reserva de vagas no ensino superior. Já havia previsão do julgamento de que mecanismos adicionais pudessem ser adotados, sendo entrevistas, formulários e formação de comissões complementares, como é o caso da heteroidentificação, então já se suscitava essa possibilidade”, finaliza Fleury.
SERVIÇO
I Encontro de Formação das Comissões de Heteroidentificação - UFU
Palavras-chave: políticas públicas cotas heteroidentificação
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