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Leia Cientistas

Vozes apagadas, resistências acesas 

Desafiando os algoritmos da mesmice

Por: Helton Luiz de Oliveira*
Publicado em 14/04/2025 às 09:39 - Atualizado em 15/04/2025 às 13:45

A voz vai além de sua dimensão fisiológica; ela representa identidade, expressão e presença (foto: Freepik)

 

Cada voz tem sua cor: O silenciamento na era da tecnologia

O Dia Mundial da Voz, celebrado em 16 de abril, costuma ser marcado por reflexões sobre a saúde vocal e a importância do cuidado com as cordas vocais. No entanto, a voz vai além de sua dimensão fisiológica; ela representa identidade, expressão e presença. Cada voz tem sua cor. Todavia, muitas se tornam invisíveis ou apagadas pelo grito de poder. Cores que traduzem novo foco, nova visão, nova forma de pensar, muitas das vezes são apagadas porque o delírio da mesmice teima em permanecer. Como apagar as vozes na era da tecnologia? Ou como ter voz em meio à pretuberância tecnológica pós-moderna?

O silenciamento das vozes divergentes

O avanço tecnológico nos trouxe infinitas possibilidades de comunicação, mas também mecanismos sofisticados de silenciamento. O que antes era feito por meio da censura explícita hoje ocorre por sobrecarga informacional, algoritmos que privilegiam determinados discursos e pelo domínio das grandes corporações sobre o fluxo de informações. As vozes que trazem perspectivas inovadoras, críticas e disruptivas frequentemente são abafadas pelo ruído predominante de ideias recicladas e do pensamento homogêneo.

Pierre Bourdieu (1997) argumentava que a linguagem e o discurso são ferramentas de poder. Quem controla os meios de disseminação da informação também define quais vozes são ouvidas e quais são marginalizadas. A mesma lógica se aplica ao universo digital: a repetição e a viralização de conteúdos formatados dentro de padrões hegemônicos acabam invisibilizando narrativas que fogem ao status quo.

A ditadura do algoritmo: Quem pode falar?

Com a ascensão da inteligência artificial e das redes sociais, a visibilidade das vozes passou a depender não apenas do mérito do discurso, mas da lógica imposta pelos algoritmos. Cathy O'Neil (2016), em Weapons of Math Destruction, alerta sobre como modelos algorítmicos perpetuam desigualdades ao reforçar padrões preexistentes. Se uma voz não se encaixa na métrica do engajamento programado, ela se perde na vastidão digital.

Essa "pretuberância tecnológica", termo que ilustra a supremacia dos mecanismos digitais sobre a autonomia vocal, evidencia como é cada vez mais difícil ser ouvido sem estar atrelado às dinâmicas da performance e do consumo de atenção, transformando as plataformas digitais em verdadeiros campos de batalha pela visibilidade.

Resistência e ressignificação da voz

A história mostra que toda tecnologia, por mais controlada que seja, pode ser ressignificada. Angela Davis (1981), em Women, Race & Class, ressalta a importância da coletividade na resistência a sistemas opressores. Essa lógica se estende à comunicação digital: redes descentralizadas, mídia independente e iniciativas coletivas são ferramentas essenciais para reequilibrar o espaço de fala. Estratégias como a educomunicação e a democratização do acesso à mídia podem garantir que mais vozes emerjam e tenham impacto.

Em minha experiência, entender quem sou, onde estou, qual é o meu papel, são alicerces para que minha voz possa ter vida e lutar para que ela não seja apagada. Todavia, nem sempre estamos atentos a tudo isso, pois é uma questão de maturidade e pertencimento. Este trecho reforça que o autoconhecimento e a consciência de nosso papel no mundo são fundamentais para que possamos reivindicar nosso espaço e garantir que nossas vozes não se percam em meio ao barulho ensurdecedor da tecnologia.

Conclusão: A voz como ato político

O Dia Mundial da Voz precisa ser também um momento de reflexão sobre o direito de falar e ser ouvido. Se cada voz tem uma cor, devemos garantir que nenhuma delas seja apagada pelo delírio da mesmice. Em tempos de tecnologia dominante, ter voz significa mais do que emitir som; significa resistir, inovar e garantir que o futuro não seja um eco monótono do presente.

 

*Letrólogo, especialista em psicopedagogia, mestre de cerimônia, técnico em assuntos estudantis lotado na Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (ProPP).

 

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Palavras-chave: Voz Dia da Voz resistência licenciamento algorítimo Tecnologia

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