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Homenagem

É possível alguém ser um setor da UFU? Se for o Velso Carlos, sim!

Servidor mais antigo do Centro de Documentação e Pesquisa em História encerrou, no mês passado, suas atividades na UFU

Publicado em 10/05/2023 às 09:37 - Atualizado em 22/08/2023 às 17:04

Velso Carlos de Souza dedicou todos os seus anos como servidor da UFU ao trabalho de conservação e restauração de documentos e bens históricos para a cidade. (Fotos: Milton Santos)

Sereno, sorridente, bem humorado e disposto. É assim que Aline Guerra, técnica em Laboratório de Ensino de História do Centro de Documentação e Pesquisa em História (CDHIS), da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), uma colega de trabalho do Velso Carlos de Souza, técnico em conservação e restauro, descreve o servidor. Ele entrou na UFU em 1981, como estudante de Economia e, em 1985, ingressou no CDHIS, após um curto período de serviço como assistente administrativo no Centro de Estudos, Pesquisas e Projetos Econômico-sociais (Cepes). Seu último trabalho como servidor ativo da instituição ocorreu na última sexta-feira de abril, 28, quando encerrou o curso de extensão ofertado pelo CDHIS e ministrado por ele.

Graduanda em História e estagiária voluntária do CDHIS, Beatriz Bife também descreve o Velso, seu ex-coordenador de estágio, de forma parecida. “Ele é extremamente inteligente, esperto, divertido, sempre sorridente, brincando (...) e flamenguista fanático. No dia a dia, esse lado flamenguista sempre impera”, completa Aline. Já o outro colega de setor, o arquivista do CDHIS, Raphael Bahia, define o Velso da seguinte maneira: “Ao mesmo tempo que é uma pessoa de um conhecimento muito grande, ele tem uma humildade também para conseguir transmitir isso com serenidade. O conhecimento que ele tem, tanto técnico, quanto do próprio acervo, não fez com que uma certa soberba passasse por cima de quem ele é como pessoa; trata todo mundo igual.”

De acordo com os colegas de trabalho, Velso sempre foi um profissional com muito orgulho de ser um servidor público. Independentemente do dia, da hora ou do momento que estava passando, sempre atendia o público com muita gentileza e sorrindo. Além disso, ele também era um ótimo professor. Todos eles aprenderam muito com o mestre da conservação e restauro de documentos da UFU. Não só quem trabalha no CDHIS, mas também todos que participaram dos minicursos ofertados pelo setor e as turmas de graduação da UFU que faziam algum trabalho por lá: Jornalismo, Geografia, História, Filosofia… “A gente chega sem saber nada. Como a gente tem que fazer um trabalho muito direcionado para pesquisa, precisa ter um conhecimento intenso daquela documentação, e ele, como se pegasse na mão, vai mostrando as coisas. E no dia a dia do trabalho também, ele vai ajudando a gente quando tem dúvidas; é uma pessoa disposta a passar o conhecimento”, relata Rafael.

 

A trajetória do 'pai' do CDHIS

Quando Velso de Souza chegou na UFU a situação era outra. "Era tudo diferente, né? Principalmente a estrutura, as construções. As dificuldades que a gente tinha aqui, no meu caso que vinha de ônibus, era legal não. Era tudo um pouquinho diferente”. Foi assim que o Velso continuou a minha frase. Já quando questionado como a UFU era para ele hoje, respondeu: “É o fim. [risos] É o fim de um ciclo na verdade. A UFU, no meu caso, foi essencial porque eu me formei aqui e trabalhei aqui. Pra mim foi quase tudo. Foi uma... foi uma parte da minha vida construída aqui dentro da UFU”. Foram quase 42 anos entre estudante e servidor da instituição.

Todo o acervo do CDHIS tem alguma interferência do trabalho do Velso, além da organização estrutural do local e o desenho da sala e alguns móveis

Ele se considera uma “cria do CDHIS”, já que está no centro desde a sua criação. Na época, logo após se formar em Economia, e estar trabalhando no Cepes, recebeu a proposta do setor e achou interessante a mudança. O gosto pela história fez a nova oportunidade brilhar aos olhos. Hoje, além das histórias que ajudou a conservar, ele também carrega várias consigo, como a chegada da primeira coleção do CDHIS - e ele estava lá. “Quando eu entrei tinha um senhor, o João Quituba, e ele foi o primeiro a doar uma coleção para o CDHIS. Eu lembro que, na época, ele tinha um certo receio. Sempre doava por partes. Ele vinha, via o trabalho... Era um senhorzinho comunicativo, um 'cara' bem legal mesmo. Aí ele vinha, olhava, via que estava sendo legal o trabalho do pessoal e chegava com uma malinha com mais itens. Eram fotografias que ele colecionava. Fotografias e alguns documentos, e ele trazia mais. Foi no início, em 87”, relembra Velso.

Outra memória muito importante para ele, e que recorda com carinho, é a integração com os colegas da UFU por meio do esporte mais brasileiro: o futebol - e vocês lembram que ele é flamenguista, né? “Eu gosto de contar [também] de quando eu saía para jogar futebol, porque eu fazia parte do sindicato e a gente viajava. Aí eu conheci uns lugares legais. Então, foi uma parte legal da minha vida. Eu gosto de futebol. Jogo igual os cara do Flamengo. Eu jogo igual a eles. Então, pra mim foi legal essa parte. Essa parte aqui na UFU é boa”, ressalta o ex-servidor.

Velso, que adorava chegar no CDHIS e ter seu momento do cafezinho na cozinha com os colegas e relaxava quando ia fazer o processo de restauração dos documentos, também aponta a importância do centro para a UFU e a cidade de Uberlândia. “Eu me lembro que, na época que eles pensaram no Centro de Documentação, Uberlândia não tinha história, não tinha memória. Eu me lembro que até teve um projeto que era de fotografar os casarões que estavam se perdendo; então, esse grupo de professores se reuniram e fundaram esse centro para pegar a documentação, os acervos particulares e construíram essa memória da cidade de Uberlândia, que não tinha. Fundaram o curso de História, mas não tinham a história da cidade. Então é isso, o centro existe pra isso. [Outra coisa] é importante para os alunos. Tivemos vários alunos que passaram por aqui, fizeram suas monografias, suas dissertações com documentação daqui. Então, é interessante para o curso de História. Inclusive, eu lembro que na época que eles montaram o curso de doutorado, o centro foi a principal justificativa para a criação do programa", testemunha Velso.

 

Ensinamentos e memórias não se aposentam

Rafael, Aline e Beatriz tiveram dificuldade em apontar um ensinamento que fica do Velso para a vida e profissão deles, visto que são muitos. Rafael ressalta a atenção e o cuidado com a manipulação dos documentos. “[Tem] a forma certa de você manusear [o documento], pra você não causar nenhum dano. Dentro dessa parte de conservação preventiva, além dos fatores ambientais, da própria degradação natural do documento, o fator humano é o que mais danifica. Então, se você não souber como fazer a manipulação, você joga um trabalho todo fora e isso daí sempre me lembra ele. Vai pegar no documento? Lembra das coisas que ele fala”, destaca Rafael.

Da esquerda para a direita: Aline Guerra, Velso de Souza, Rafael Bahia e Beatriz Bife

Já a Aline diz que sempre lembrará do Velso em cada cantinho do CDHIS; lembranças de bons momentos de parceria e também numa pequena “gambiarra” que faz para conseguir corrigir um erro de trabalho. “Por exemplo, quando você vai condicionar, imagina uma folha solta, como essa, você vai fazer como se fosse um envelope. Aí, você faz as medições, as margens e vai cortar. Eu sempre corto torto, por mais que eu dobre. Aí, pra eu não ter que dobrar novamente, o Velso - não é o jeito correto; então, isso traz uma certa contrariedade - me ensinou um macete de como você disfarça o que fez errado. Você vira e apara tirando aquela quina que está sobrando com a régua e com o estilete. Então, você meio que dá uma disfarçada no trabalho que fez e não ficou tão bom. Ele orientava, reforçava como é que se fazia para dobrar, para ficar reto, mas o meu acabava ficando torto todas as vezes”, revela a técnica em Laboratório de Ensino de História.

Até mesmo quem chegou há pouco tempo, como a Beatriz, que está estagiando há quatro meses no setor, já tem ensinamentos para levar. “O que mais marca é uma coisa que ele ensinou na encadernação. Quando a gente vai fazer a parte da capa, tem que colar o papel no papel cartão. Aí cola e quando vai dobrar, para fazer a quina, ele tem um macetinho muito só dele, que você dobra de um jeito específico e dobra por cima. Então, acho que sempre que eu vou fazer essa parte eu lembro do Velso falando 'não, ó, faz desse jeito, assim'. Tem outra coisa também que é uma marca dele. No processo de encadernação a gente coloca uma espécie de papel para poder segurar o livro junto. Aí ele recorta as quinas do papel e fica curvadinha e aí você sabe que foi o Velso que restaurou aquele livro”, relata.

Velso no seu momento de relaxamento, quando realiza o processo de conservação e restauração dos documentos

 

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Palavras-chave: servidor aposentado Cdhis

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