Publicado em 23/08/2019 às 14:51 - Atualizado em 22/08/2023 às 16:56
A Erythrodiplax ana é uma espécie de libélula encontrada no Clube de Caça e Pesca Itororó de Uberlândia. (Foto: Arquivo do pesquisador)
Você provavelmente deve ter acompanhado nos noticiários dos últimos dias a queimada de florestas, majoritariamente na região Norte do país. A destruição de biomas como o da Amazônia ou mesmo o Cerrado, presente no Sudeste, traz consequências diretas para todo um ecossistema. Desequilibram um ambiente complexo, que envolve nascentes e mananciais, que alimentam rios e são importantes para o desenvolvimento de espécies vegetais e animais. Com a perda da biodiversidade e das condições para que esse sistema se sustente, aumentam os riscos de extinção de espécies e de desconstrução do próprio bioma.
A necessidade da conservação desses ambientes é urgente, mas para que haja a preservação, é preciso conhecer as relações entre os seres vivos. A ecologia é o ramo da ciência que tem por objetivo estudar essas relações entre organismos e os ambientes onde eles vivem, ou seja, a ligação existente nas suas interações com a natureza. A primeira menção ao termo ecologia aconteceu em 1869, pelo cientista alemão Ernst Haeckel.
De lá pra cá, os estudos se desenvolveram pelo mundo e hoje existe uma gama variada dos mais diferentes projetos de pesquisa relacionados à ecologia. Pensando em estimular jovens cientistas a aprofundarem seus conhecimentos sobre a área, o professor Kleber Del-Claro, do Instituto de Biologia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), em parceria com o professor Rhainer Guillermo, da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), escreveu e editou o livro “Aquatic Insects Behaviour and Ecology”.
O professor Kleber Del-Claro é diretor de Pesquisa da UFU. (Foto: Arquivo do pesquisador)
A obra
O livro, escrito ao longo de dois anos e publicado pela editora Springer, tem o objetivo de falar a respeito do comportamento e ecologia de insetos aquáticos ao redor do mundo, e concentrou esforços em destacar a presença desses animais em países dos trópicos, onde se conhece muito sobre taxonomia e morfologia, mas pouco sobre o papel e as contribuições que desempenham no ambiente em que estão inseridos. Del-Claro observou que essa é a região com a menor quantidade de estudos desenvolvidos na área e que carece de preservação urgente.
“Quase tudo que se conhece sobre insetos aquáticos, especialmente nos trópicos, é descrição taxonômica. Quem é o animal, como ele é, onde vive e um pouco do que ele faz. Se conhece muito pouco do comportamento da ecologia”, afirma o professor. “Conhecer o comportamento e a ecologia desses animais é de fundamental importância para a gente entender as cadeias tróficas, os ciclos de energia e a participação desses ‘bichos’ nos ambientes aquáticos”, explica.
Para que a obra pudesse ser escrita foram realizadas pesquisas de biologia básica, ecologia, ecologia do habitat, alimentar, reprodutiva, da territorialidade, taxonomia, morfologia, geografia da área, mapeamento hidrológico de rios, defesa de território, engenharia mecânica com a biomimética, estudos químicos e marcação com isótopo radioativo, além do registro de fotografias de varredura e eletrônicas.
O livro conta com 17 capítulos, escritos com a participação de professores, alunos e ex-alunos da UFU e pesquisadores de países como Argentina, Alemanha, Espanha, Estados Unidos, Japão, México, República Tcheca e Ucrânia. Del-Claro ressalta a participação de pesquisadores renomados, como o professor ucraniano Stanislav Gorb, indicado por duas vezes ao prêmio Nobel, que escreveu um capítulo sobre “o uso dos insetos aquáticos na Biomimética”. No trecho, Gorb descreveu como a estrutura física desses insetos pode auxiliar na biotecnologia sustentável.
Para que esses estudos pudessem ser feitos, houve o financiamento de institutos de pesquisa e agências de fomento, como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Fundações de Amparo à Pesquisa (Faps), além das agências fomentadoras de pesquisa dos respectivos países participantes.
A Diastatops obscura é outra espécie de libélula encontrada no Clube Caça e Pesca Itororó de Uberlândia. (Foto: Arquivo do pesquisador)
Novas espécies em Uberlândia
Del-Claro revela que as pesquisas realizadas no Triângulo Mineiro mostraram uma certa preocupação quanto aos cuidados com a conservação do Cerrado. Segundo ele, a região é conhecida pela grande quantidade de veredas, riachos e corredeiras de montanhas que dão origem a grandes rios como o São Francisco, Paranaíba, Grande e Paraná. “O maior número de veredas no Brasil é no Triângulo Mineiro e nós estamos acabando com as veredas próximas à cidade, que estão virando condomínios privados. O que acontece com isso? Nós estamos matando um manancial de água de rios grandes”, alerta.
O pesquisador relata que a biodiversidade de insetos aquáticos encontrados em Uberlândia é vasta e novas espécies foram registradas no Clube Caça e Pesca Itororó. “Com esse livro nós descobrimos que na vereda do Caça e Pesca existem mais de 39 espécies só de libélulas. Na Espanha, existem oito ou nove no país inteiro”, compara. “Nós descobrimos que um monte de libélulas e trichopteras, animais pequenos, são bioindicadores importantes. Eles dizem se a água está preservada ou poluída, se é consumível ou não, se a vereda está progredindo ou morrendo, por exemplo”, completa.
Segundo dados de 2018 do Ministério do Meio Ambiente, houve diminuição de 43% no desmatamento do Cerrado em comparação com o ano de 2016. Apesar do recuo, a perda da cobertura vegetal do bioma chega a 51% do território original. “Se a gente não entender a ecologia desses animais aquáticos, não entenderemos como a gente mantém a biodiversidade. Biodiversidade morta, um riacho sem vida, assoreia, morre, vira um lamaçal, um areial e vai embora. Você precisa ter quem faz fluxo dentro daquilo”, alarma Del-Claro.
As pesquisas em ecologia são antigas, no entanto, o aprofundamento em ecologia e comportamento de animais aquáticos é recente. Por isso, o livro tem como um dos focos passar o conhecimento sobre o assunto adiante, incentivar uma geração de futuros pesquisadores e apresentar indicativos do que é preciso fazer para estudar melhor determinado animal e para preservar o ambiente onde ele vive. A obra encontra-se disponível para venda na plataforma Amazon, terá uma cópia doada para a biblioteca da UFU e também encontra-se disponível na plataforma da editora Springer.
Palavras-chave: livro ecologia Insetos Aquáticos Biologia
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