Publicado em 26/01/2022 às 16:26 - Atualizado em 22/08/2023 às 16:39
Livro O Negro no Futebol Brasileiro, de Mario Filho (Foto: Arquivo da pesquisadora)
“Eu já fui preto e sei como é”. A frase de Robson, presente nas páginas iniciais do livro “O Negro no Futebol Brasileiro”, de Mario Filho, é essencial para o debate sobre identidade e negritude dos atletas negros.
A identidade, segundo Stuart Hall, é maleável e construída no decorrer do tempo. As vivências, o ambiente e a maneira como o próprio sujeito assimila tudo a sua volta compõem sua identidade e a forma como este se vê. Essa identidade não passa a ser construída apenas quando uma pessoa negra cresce: ela é relacionada a historicidade dos pretos e pardos, na maneira como eles construíram suas próprias identidades e as apresentaram para o mundo.
Somado a isso está a negritude, definida aqui como os componentes culturais do que é chamado de “cultura popular negra”. Estes são os espaços ocupados pelos pretos e pardos, as músicas que relatam suas histórias, as roupas que representam a forma como interpretam o mundo. São seus cabelos, suas gírias e tudo o que trouxeram dos seus ancestrais.
Pensando nisso, a frase inicial desse texto levanta questionamentos: como alguém pode deixar de se identificar como negro? O que levou esse atleta a acreditar que não era mais uma pessoa negra? Quem é o ser negro dentro do futebol? O que significa ser negro nesse espaço?
Mas esse assunto já era latente. Em 2005, o jogador Grafite atuava no São Paulo FC. Durante um jogo da Libertadores da América, ele foi alvo de insultos racistas vindos do zagueiro Desábato, do Quilmes - Argentina. Após o fim da partida, o argentino recebeu voz de prisão ainda no gramado do Morumbi. Esse foi considerado o primeiro caso de racismo devido à ação da polícia. Porém, basta uma breve leitura nos escritos de Mario Filho para perceber que desde o ingresso do negro no futebol, em 1905, com Francisco Carregal, este espaço foi violento.
Desde o caso Grafite, os casos de racismo tomaram conta dos noticiários esportivos, sendo, na maioria das vezes, o único momento em que um negro era pauta nesses programas. A proposta de abordar a construção da identidade do atleta negro nasceu da diminuição dos pretos e pardos a apenas alvos de racismo. A diferença, como Hall define o preconceito, não define a identidade de um sujeito, mas sim a compõe.
Enquanto os programas esportivos se afastam do que realmente se configura como jornalismo, eles retornam para entrevistar negros quando esses são excepcionais ou sofrem violência racial. Por isso, é importante compreender o papel do jornalismo esportivo nesse processo. O esporte é político e social e o jornalismo que o acompanha também deve ser.
Historicamente, a interpretação - também chamada de produção de sentido - sobre a identidade do negro no jornalismo esportivo é rasa e racista. A editoria se baseia na diferença e reduz suas pautas a um mero entretenimento de almoço. O jornalismo esportivo permaneceu focado na branquitude, no distanciamento dos atletas de suas características negras e em pautas rasas para abordar os jogadores negros. Assim, eles só são assunto quando se fala sobre racismo ou quando novembro chega. E esse cenário será perpetuado enquanto o jornalista esportivo não compreender a relevância social do esporte que se propõem a trabalhar.
*Naiara Ashaia Rodrigues dos Santos é graduanda em Jornalismo pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Você pode ler esta pesquisa completa aqui.
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Palavras-chave: identidade negritude Jornalismo Leia Cientistas
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