Publicado em 10/05/2023 às 14:25 - Atualizado em 22/08/2023 às 16:38
Ralciane de Paula Menezes*
Reginaldo dos Santos Pedroso**
Estudo realizado na UTI neonatal de um hospital público investigou a presença da levedura Candida parapsilosis. (Foto: Freepik)
Os fungos estão em praticamente todos os lugares que se possa imaginar: na nossa pele, no nosso intestino, nos animais, nas plantas, no solo, na água, espalhados pelo ar e, inclusive, em ambientes hospitalares e serviços de saúde em geral, onde devem ser controlados, pois sua presença pode representar risco de infecção devido à condição de saúde dos indivíduos ali atendidos.
No ambiente hospitalar, eles podem ser encontrados em superfícies de cômodas, mesas, recipientes para sabonetes, maçanetas de portas, pias e torneiras, como, também, nas mãos dos profissionais e pessoas que circulam pelo ambiente. Nem todos os fungos são perigosos à saúde ou causam doenças; no entanto, quando se trata de serviços de saúde, entendemos que a redução da quantidade de fungos no ambiente é necessária, pois ali transitam ou estão internados indivíduos já debilitados. Imagina em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI), adulto, pediátrica e neonatal, onde os pacientes já apresentam comprometimento da saúde, fazem uso de diversos dispositivos para manutenção de algumas funções vitais e estão mais propensos a desenvolver infecções! Nesses locais, os fungos representam um grande perigo.
Um estudo realizado na UTI neonatal de um hospital público investigou a presença de uma levedura específica, chamada Candida parapsilosis, que pode causar infecções de corrente sanguínea em indivíduos, especialmente internados, podendo ser fatais. Nessa pesquisa, os autores encontraram essa levedura em portas, pias, torneiras, leitos, dispensadores de sabonete e mesas de prescrição de medicação; ou seja, em locais onde a maioria dos profissionais de saúde da unidade tem contato constante. E, quando investigada a presença dela nos recém-nascidos internados, ela foi encontrada na boca e na região perianal, além de dispositivos invasivos, como cateteres e dreno que os bebês utilizavam, e foi isolada do sangue de alguns desses bebês. Interessante que essa levedura também foi encontrada nas mãos da mãe de um dos bebês com infecção.
E por que estudar especificamente a espécie Candida parapsilosis? Antes de responder, vamos falar do gênero Candida. Esse gênero de microrganismo tem uma espécie bastante conhecida, que é Candida albicans, principal responsável por doenças que muitos conhecem, como o “sapinho” na boca de bebês recém-nascidos e a candidíase vulvovaginal na mulher adulta. Candida albicans está presente nas mucosas (boca e vagina) e no trato gastrintestinal de muitas pessoas. No entanto, em indivíduos que apresentam alguma deficiência das suas defesas ou algum comprometimento imunológico, ela pode causar doenças fáceis de tratar, como “sapinho” e micose de unha e pele; mas também infecções muito graves e até fatais, como infecção de corrente sanguínea. Por estar presente na microbiota de muitas pessoas, ela é considerada uma das principais espécies de fungos que causam doenças no ser humano. Já a espécie Candida parapsilosis pode ser encontrada na pele de muitas pessoas, e até mesmo no ambiente, talvez por ser mais resistente, sendo capaz de se manter viva no ambiente por mais tempo. Assim, no estudo mencionado anteriormente, os pesquisadores verificaram a presença dela como um marcador da disseminação de fungos deste gênero entre o ambiente, as pessoas e os pacientes.
Quando um fungo é isolado do sangue, ele está causando infecção. Assim, chamamos de infecção de corrente sanguínea. E, no estudo que citamos, Candida parapsilosis foi encontrada no sangue, na pele e mucosa de mães e bebês. Logo, demonstramos que o fungo circula livremente, podendo chegar até os bebês através das mães ou pelo contato dos profissionais de saúde durante o cuidado. Como esses bebês estão mais vulneráveis e, muitas vezes, encontram-se muito debilitados, podem desenvolver infecções graves por espécies fúngicas que podem fazer com que fiquem mais tempo internados ou leve até a óbito em poucos dias após a infecção. Podemos dizer que o encontro do fungo com o paciente e a infecção é uma questão de oportunismo: a oportunidade de o fungo encontrar um hospedeiro (paciente) que esteja debilitado, com o sistema de defesa enfraquecido, para ele (o fungo) se alojar e se multiplicar, causando danos. O objetivo do fungo não é “matar” o hospedeiro, mas, sim, sobreviver, multiplicar, perpetuar sua espécie.
Mas como podemos evitar que estes fungos cheguem até pacientes debilitados como aqueles internados em UTI? Não é tão difícil... Higienizar as mãos antes e após entrar nesses ambientes ou ter contato com esses pacientes é uma das medidas. Como vivenciamos no período da pandemia da covid-19, a higienização das mãos com água e sabão ou com álcool gel 70% é uma ação simples, mas muito eficaz no combate às infecções e que pode salvar vidas! Não podemos dar as mãos para os fungos e outros microrganismos em ambientes de serviços de saúde. Pode ser perigoso!
O artigo Candidemia by Candida parapsilosis in a neonatal intensive care unit: human and environmental reservoirs, virulence factors, and antifungal susceptibility está publicado na revista Brazilian Journal of Microbiology e você pode acessá-lo através do link: https://doi.org/10.1007/s42770-020-00232-1.
*Ralciane de Paula Menezes é biomédica e doutora em Ciências da Saúde. Desenvolve pesquisas na área de epidemiologia das infecções fúngicas, especialmente por espécies de Candida, epidemiologia molecular, fatores de virulência e susceptibilidade a antimicrobianos de isolados fúngicos obtidos do ambiente hospitalar. Atualmente estuda compostos naturais que podem ter ação antifúngica frente a espécies de fungos clinicamente importantes. É técnica de laboratório lotada no Curso Técnico em Análises Clínicas da Escola Técnica de Saúde da Universidade Federal de Uberlândia (Estes/UFU).
**Reginaldo dos Santos Pedroso é farmacêutico e bioquímico, atua na área de Análises Clínicas e na pesquisa com leveduras patogênicas. É doutor em Biociências Aplicadas à Farmácia pela USP e tem pós-doutorado em Promoção de Saúde. É professor do Curso Técnico em Análises Clínicas, da Escola Técnica de Saúde (Estes) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU).
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