Publicado em 27/11/2023 às 11:54 - Atualizado em 29/11/2023 às 11:04
Após três meses de espera, a ideia de Larissa Borges de Mello, estudante da graduação de Engenharia Elétrica da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), finalmente poderia ser colocada em prática. O interesse pelos assuntos relacionados às mudanças climáticas surgiu, em julho de 2023, em seu estágio de férias na usina nuclear Angra, em Angra dos Reis, Rio de Janeiro. E foi lá, também, que as ideias de Mello começaram a se desenrolar.
Antes, porém, a jovem estudante devia seguir alguns passos. Primeiro, precisava de uma equipe. Um a um, Mello foi convidando cada integrante a se juntar ao projeto que, em sua mente, já se desenhava. O segundo passo não era mais fácil: precisavam lidar com as regras do concurso. Era necessário estarem atentos a cada minúscula regra e, para isso, Mello muniu seus colegas de vários artigos, estudos e dados. Tudo que podiam saber e estudar até a competição em outubro, fizeram.
O terceiro, e último, passo: a competição. O International Nasa Space Apps Hackathon ocorrida entre sete e oito de outubro, levou quase 60 mil participantes à competição que aconteceu virtualmente no mundo inteiro. Desafiando estudantes a criarem soluções relacionadas à Terra e ao espaço desde 2012, o evento, no formato de Hackathon, que é uma maratona de curta duração, reúne pessoas interessadas em criarem soluções arrojadas para problemas específicos.
Na pequena sala, cedida a Gabriel Ribeiro Filice Chayb, graduando em Sistemas de Informação pela UFU, de onde saiu o protótipo do projeto nomeado para a etapa global do Hackathon da Nasa, estavam presentes os três alunos da UFU, Mello, Chayb e Gustavo Ferreira Tavares, graduando em Engenharia Biomédica pela UFU. Enquanto isso, outros dois integrantes, que estavam em outros lugares, Izabel Chaves, estudante do ensino médio, em Belo Horizonte, e Vinícius de Carvalho Zanini, graduando em Engenharia Biomédica pela UFU, em São Paulo, se reuniam virtualmente com os colegas. “Entramos às 10h da manhã do sábado, acreditando que sairíamos em poucas horas, mas quando vimos, já eram quase 23h da noite e ainda havia muito o que fazer”, relata Tavares.
Mas, se parece difícil criar soluções inovadoras para a Nasa, o prazo de 48 horas para produzir, apresentar e defender o projeto criado do zero, atendendo uma das principais especificações da competição, torna o desafio ainda maior. “A gente contou com as mentorias da empresa do Hackeaton no Brasil, que foi a organização responsável por nos ajudar e também o recurso para a gente se inscrever”, comenta Mello. Com instruções e dicas valiosas, a equipe Dust Trackers, rastreadores de poeira em tradução livre, criaram um modelo de análise de dados de tempestades de poeira, utilizando o sensor de investigação da fonte de poeira mineral da superfície terrestre (Emit).
Enviado pela Nasa para a atmosfera em 2022, o Emit monitora as tempestades de poeira pelo planeta. Essa observação ocorre conforme reflexo da luz que, em contato com as partículas de poeira, viajam pelo mundo. Nos últimos anos, com a degradação da Terra a um ritmo cada vez maior à poluição atmosférica, tem transformado o solo fértil em blocos de areia, como afirma a Organização Meteorológica Mundial.
Além disso, as tempestades de poeira também colaboram com a elevação da temperatura, com intervenção no funcionamento do meio ambiente, e ameaçam a saúde pública com os elementos tóxicos que carregam os vendavais.
Tempestades de poeira e poluição
A escolha pelo tema traz questões importantes sobre o atual cenário da sustentabilidade. As tempestades de areia vêm preocupando autoridades mundiais e têm aparecido cada vez mais em pesquisas. Dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), as frequentes tempestades de poeira ferem 11 deles, atingindo clima, atmosfera e ecossistemas.
“Para se ter uma ideia, uma tempestade levanta tudo aquilo que, não só, vai destruir bens materiais, mas alastram infecções respiratórias, poluem a água, afetam plantações”, afirma Tavares. As partículas de poeira mineral afetam regiões a milhares de quilômetros de distância do seu lugar de origem. Para se ter uma ideia, as partículas finas do deserto do Saara, maior deserto do mundo, podem ser encontradas nas ilhas caribenhas, do outro lado do oceano Atlântico.
A poeira soprada para zonas populosas afeta as condições do ar, refletindo na saúde da população. As doenças mais comuns relacionadas a essas partículas são respiratórias e cardiovasculares. As tempestades ainda podem ser piores quando carregam o elemento mais abundante da crosta terrestre: a sílica.
A sílica, utilizada em várias áreas da construção civil, indústria automotiva e da beleza, quando presente em partículas e transportada pelo ar, aumenta o risco de doenças autoimunes, doenças de pele e vários tipos de câncer. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), bilhões de pessoas respiram ar insalubre que excedem os níveis de qualidade recomendados pela própria organização. Esses efeitos ainda são mais sentidos nas regiões subsaarianas que, curiosamente, são as que menos poluem. Por estarem próximas às regiões desérticas, e as tempestades de areia serem frequentes, a equipe Dust Trackers buscaram solucionar este problema com um protótipo de aplicativo, como mencionado, idealizado em 48 horas.
Para conscientizar sobre os impactos em várias dimensões no ambiente e nas pessoas, a equipe criou um modelo de análises de dados para monitorar de perto as comunidades mais vulneráveis a essas tempestades de poeira. “Na nossa ideia, nosso aplicativo usa basicamente dados do sensor Emit, que identifica a composição mineral de cada região. Nós cruzamos esse dado da composição com as direções do vento e as coordenadas das tribos. A gente consegue identificar quando essa pluma de poeira está chegando até eles e qual a composição mineral do ar. Assim eles conseguem se proteger e se prevenir”, afirma Mello.
Com esse projeto em mãos, a equipe foi uma das 16 escolhidas no Brasil para a nomeação global da competição, sendo reconhecida como um dos melhores trabalhos brasileiros. Com a nomeação veio, também, a premiação de uma bolsa de estudos, por parte da organização brasileira, na The Founder Institute, maior programa de lançamento de startup do mundo.
Para o grupo, o fato de poderem ajudar aos mais necessitados e conscientizar a população sobre os efeitos das tempestades de poeira tornou-se prioridade nesse processo. “Nossa missão é preencher essa lacuna de informações que faltam sobre as regiões afetadas na África”, diz Larissa Mello. “Quanto mais fomentos, mais iniciativas como essa podem contribuir para melhorar o sistema de previsão dessas tempestades de poeira, conscientizando a sociedade”, finaliza.
Saiba mais sobre o projeto no site.
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Palavras-chave: Inovação e Sustentabilidade #Ciência
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