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Saúde

Licença de 6 meses e redução na jornada de trabalho aumentam aleitamento materno

Pesquisa da UFU ouviu gestores e trabalhadoras formais e informais

Publicado em 26/09/2024 às 13:13 - Atualizado em 01/10/2024 às 15:02

A recém-doutora Marília Neves Santos (à esquerda) foi orientada pela professora Ana Elisa Madalena Rinaldi (à direita). (Foto: Milton Santos)

 

Um estudo feito com 198 mulheres de Uberlândia concluiu que a duração do aleitamento materno está diretamente relacionada com as condições de trabalho das mães, como tempo de licença-maternidade e carga horária diária e semanal. O levantamento faz parte da tese de doutorado de Marília Neves Santos, defendida em junho deste ano no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade Federal de Uberlândia (UFU).

As mulheres – 163 trabalhadoras formais (servidoras públicas ou contratadas de acordo com a Consolidação das Leis do Trabalho/ CLT) e 35 trabalhadoras de formas de emprego não-padrão (autônomas e trabalhadoras por conta própria) – responderam a um questionário sobre dados sociodemográficos, condições de nascimento e alimentação do bebê e condições de trabalho. Na fase seguinte, 16 dessas mulheres participaram de entrevistas sobre o período de amamentação e o retorno ao trabalho.

Também foram entrevistados oito gestores que atuam nos locais de trabalho dessas mulheres. Eles responderam a questões sobre a forma de organização das atividades realizadas pelas trabalhadoras no momento do afastamento para licença-maternidade e após o seu retorno. 

O aleitamento materno é um direito previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente e as condições para que ele aconteça devem ser propiciadas pelo poder público, pelas instituições e pelos empregadores. O Ministério da Saúde recomenda a amamentação exclusiva nos primeiros seis meses de vida do bebê e complementada com outros alimentos até os dois anos de idade ou mais. Os benefícios, de acordo com o ministério, envolvem a proteção à saúde da criança, como contra infecções, e da mãe, incluindo a diminuição de risco de alguns tipos de câncer. 

Entretanto, com o aumento da participação das mulheres no mercado de trabalho, que reproduz as desigualdades de gênero construídas socialmente, tem recaído sobre as mães o desafio de encontrar modos de equilibrar o trabalho remunerado com o cuidado da família. Essa situação persiste apesar das estratégias de promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno no ambiente de trabalho lançadas nas últimas décadas no Brasil. 

São exemplos a criação da licença-maternidade de quatro meses, o direito a duas pausas diárias de 30 minutos até o bebê completar seis meses, a Cartilha para a Mulher Trabalhadora que Amamenta, o Guia para implantação de salas de apoio à amamentação e a criação do Programa Empresa-Cidadã, que permite a extensão da licença-maternidade para trabalhadoras de empresas privadas, de quatro para seis meses. A empresa custeia estes dois meses adicionais em troca de reduções fiscais.

 

Direito ao aleitamento materno está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente
Direito ao aleitamento materno está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente. (Foto: Freepik)

 

“Nós identificamos que um período de licença-maternidade igual ou superior a seis meses reduziu em 40% o risco da interrupção do aleitamento exclusivo, possibilitando às mulheres amamentarem de forma exclusiva por mais tempo”, explica Santos. Por outro lado, a pesquisa mostrou que jornadas diárias de trabalho iguais ou superiores a oito horas aumentaram em 36% o risco da interrupção do aleitamento materno continuado.

Todas as trabalhadoras formais responderam que o período de licença-maternidade de seis meses é o mais adequado, pois possibilita o aleitamento materno exclusivo e a introdução alimentar. “Quando eu voltei ao trabalho, minha filha já estava com alimentação introduzida. Então, eu já voltei ao trabalho tranquila sem o receio de pensar que ela ia estar com fome”, diz uma das mães. Porém, no contexto desse estudo, tiveram licença de seis meses somente as servidoras públicas e as trabalhadoras vinculadas ao Programa Empresa-Cidadã.

A jornada diária de seis horas ou menos, segundo as entrevistadas, ajuda a evitar a necessidade de extração do leite no ambiente de trabalho. “Com relação às pausas, identificamos situação de ausência de intervalo ou tempo inferior ao preconizado pela legislação, além de ausência de instalações adequadas para extrair e armazenar o leite”, afirma a pesquisadora da UFU. 

As mães entrevistadas relataram que, para o aleitamento, o trabalho em casa pode ser benéfico. “Logo entrou a pandemia [de covid-19] e eu virei home office. Aí eu conseguia conciliar a rotina dele [do filho] com dar minhas aulas. Então ele dormia na maior parte ou, então, eu dava aula com ele do meu lado. Eu já dei aula on-line amamentando”, relata outra mãe. Porém, as entrevistadas também relataram que conciliar atividades de trabalho e de cuidado ocasiona desgaste físico e emocional e que é fundamental contar com rede de apoio.

Os gestores ouvidos na pesquisa concordam que a licença-maternidade de seis meses é mais adequada que a de quatro meses, mas 63% das empresas representadas concedem quatro meses de licença-maternidade e 38%, seis meses. “Em alguns casos ouvimos o desconhecimento do Empresa Cidadã, que chamou nossa atenção, porque ele foi criado em 2008. Sempre essa fala, ‘não temos incentivo para fazer diferente’, quando na verdade existe, mas tem que ter interesse do gestor”, diz Santos. Um dos gestores entrevistados argumentou: “a gente também precisa pensar no outro lado, que é o lado das empresas, o lado das organizações, que precisam ter o seu empregado de volta, precisam ter a continuidade das atividades, até para própria preservação dos empregos”.

A pesquisa da UFU, financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), foi orientada pela professora Ana Elisa Madalena Rinaldi, da Faculdade de Medicina (Famed/UFU), e co-orientada pelas professoras Luciana Saraiva Silva, também da Famed/UFU, e Vivian Mara Gonçalves de Oliveira Azevedo, da Faculdade de Educação Física e Fisioterapia (Faefi/UFU). 

O estudo também teve colaboração das pesquisadoras Alanna Santos de Oliveira e Ester W. Ferreira, do Centro de Estudos, Pesquisas e Projetos Econômico-sociais (Cepes), que auxiliaram Santos a encontrar, na Relação Anual de Informação Social (RAIS), do Ministério do Trabalho, as mulheres que estavam em licença-maternidade no ano de 2019. Também contribuíram com a metodologia quantitativa e qualitativa da pesquisa os cientistas Gabriela Buccini, da Universidade de Nevada (Estados Unidos), e Leandro Alves Pereira, do Instituto de Matemática e Estatística (IME/UFU).

O próximo passo das pesquisadoras será a realização de rodas de conversa com as mulheres e os gestores entrevistados para dar o retorno sobre os resultados do estudo e conscientizar sobre a importância do acesso aos direitos das mães e das crianças. 

 

 

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Palavras-chave: Nutrição Medicina saúde aleitamento Ciência

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