Publicado em 01/08/2025 às 12:12 - Atualizado em 08/08/2025 às 16:40
Era o primeiro semestre de 2024 quando Douglas Felipe Gonçalves de Almeida ingressou no mestrado em História da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Natural de Belo Horizonte (MG), ele se mudou para Uberlândia após descobrir que a instituição abrigava um grupo de pesquisa voltado para o tema que o fascinava: a relação entre sociedade e meio ambiente dentro das ciências humanas.
Fundado em 2012, o Laboratório de História da Ciência e História Ambiental (Labciamb/UFU) reúne graduandos, mestrandos e doutorandos. O grupo é coordenado pelos professores Marcelo Lapuente Mahl e Jean Luiz Neves Abreu, do Instituto de História (Inhis/UFU). “É um laboratório multidisciplinar que acolhe alunos da UFU interessados em desenvolver projetos nessa área”, explica Mahl.
Mas, afinal, o que faz um historiador ambiental? Para responder a essa pergunta, o #CiênciaResponde visitou o Labciamb para conhecer seu trabalho e uma das pesquisas desenvolvidas no espaço.
Segundo Mahl, “as questões relacionadas ao meio ambiente são estudadas por diversas áreas, especialmente pelas Ciências Naturais. Mas as Ciências Humanas também possuem ferramentas para refletir sobre esses problemas. É aí que se insere a História Ambiental, um subtema dentro da grande área da História”.
Essa vertente investiga como as sociedades humanas se relacionaram com a natureza ao longo do tempo, desde disputas por recursos até mudanças nas percepções culturais sobre o ambiente. “A História Ambiental se dedica a inserir as questões do meio ambiente no tempo, no passado e na história”, resume o professor.
O campo de estudos em História Ambiental surgiu na década de 1970, impulsionado por “um processo de amadurecimento nas discussões da contracultura e dos movimentos sociais que começaram a apontar para os impactos da sociedade capitalista no ambiente”, explica Mahl. “É a partir daí que alguns historiadores norte-americanos começam a fazer o que chamamos de crítica ambiental”, completa. Atualmente, o tema é estudado em universidades do mundo todo, com forte presença também na América do Sul.
Entre as várias possibilidades de pesquisa, o coordenador do Labciamb enumera três principais. Confira no infográfico:
A maior parte dos estudos se dirige aos impactos da sociedade no meio ambiente. “Como é que uma usina hidrelétrica impactou o meio ambiente, do ponto de vista da história? Como é que as queimadas foram utilizadas, por exemplo, para o plantio de cana-de-açúcar no período colonial ou da cafeicultura no século XIX, como isso impactou o meio ambiente?”, exemplifica Mahl.
O coordenador do Labciamb chama a atenção também para a vertente que estuda o pensamento ambientalista no passado: “Como é que, ao longo do tempo, a sociedade foi construindo reflexões sobre o meio ambiente, representando o meio ambiente e pensando exatamente em novas formas, em formas de relações mais harmônicas entre a sociedade e o meio ambiente?”.
Uma terceira vertente apontada pelo professor é o estudo de personalidades. “É importante olhar para as pessoas que, ao longo da história, desenvolveram pensamentos ou formas de reflexão interessantes, propondo novas abordagens sobre a questão ambiental. É o caso de Chico Mendes, um dos maiores nomes do ambientalismo brasileiro na década de 1980, que foi assassinado por isso”, argumenta.
Um dos trabalhos desenvolvidos no Labciamb/UFU é o de Almeida. Além de historiador, ele tem formação em Filosofia e especialização na área do Direito. Interessado em temas ambientais, reuniu seus conhecimentos nessas áreas para desenvolver seu projeto de mestrado, que aborda os sentidos de natureza em legislações ambientais mineiras na segunda metade do século 20.
Sob orientação do professor Jean Luiz Neves Abreu, ele analisa documentos legais produzidos entre 1950 e 2000, período de efervescência de movimentos ambientalistas. “Já é possível sinalizar que, em meio a essas transformações socioculturais, as legislações locais tendem a exercer um poder normativo que ignora as realidades territoriais, as particularidades dos ecossistemas e as visões culturais locais”, explica.
Entre os marcos do período estão a publicação do livro Primavera Silenciosa em 1962, a criação do Greenpeace em 1971 e a realização da Conferência de Estocolmo em 1972. “São muitos protocolos, tratados, documentos, conferências, que geram efeitos sociais. Com a Eco-92, houve um boom na legislação ambiental mineira: surgiram oito novas leis no mesmo ano”, completa Douglas.
O trabalho de campo incluiu visitas técnicas aos arquivos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, um dos momentos mais empolgantes para Almeida. Lá, ele consultou mais de 60 documentos entre leis e subsídios legislativos. “Foi uma experiência única. Prepararam uma mesa específica para mim. Cheguei a ler o artigo 225, sobre o meio ambiente, na Constituição original. Para um historiador, trabalhar com a fonte direta é fundamental”, relata.
Com base nesses materiais, Almeida aplica a metodologia proposta por Donald Worster, um dos pioneiros da História Ambiental. O autor propõe analisar três níveis (social, econômico e natural) para compreender como a ideia de “natureza” se transforma ao longo do tempo.
“A questão é trazer, no tempo, o que está sendo entendido como natureza. Um elemento puramente econômico? Um benefício ao homem? Ou algo com importância especificada em si mesma? Como é a compreensão dessa relação? Que perspectiva a sociedade adota em cada período histórico em sua relação com a natureza?”, problematiza o mestrando.
O estudo, segundo ele, evidencia o modo como o aparato legal se apropriou da natureza em território mineiro, entre 1950 e 2000. “As medidas acabaram sendo temporárias, ineficazes e descoladas da realidade dos povos nativos, dos animais e da terra”, conclui Almeida.
Mahl comenta que são várias as formas de abordar a história ambiental. “Em nosso laboratório, temos boas condições de receber alunos, seja por meio de editais, quando temos bolsas, ou quando os alunos nos procuram para formatar um projeto”.
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Palavras-chave: história história ambiental INHIS Mestrado meio ambiente Labciamb
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