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CORONAVÍRUS

Cães e gatos podem ser infectados pelo vírus da Covid-19?

Aline Santana, professora da Faculdade de Medicina Veterinária, rebate resultados de artigo que viralizou na internet e pode resultar em abandono de animais

Publicado em 17/04/2020 às 13:11 - Atualizado em 22/08/2023 às 16:52

Principal preocupação da comunidade veterinária é com a perseguição e o abandono de animais, especialmente de gatos, devido aos resultados do estudo. (Foto: Amanda Marques)

 

Publicado em 31 de março, no site bioRxiv.org, o artigo “Suscetibilidade de furões, gatos, cães e outros animais domesticados ao SARS – coronavírus 2”, em português, viralizou nas mídias sociais digitais e tem causado preocupação na comunidade veterinária. O texto descreve a introdução de uma carga viral alta do vírus causador da Covid-19 (SARS-CoV-2) pelo sistema respiratório de furões, gatos e cães. Os experimentos com os animais foram realizados em instalações do Instituto de Pesquisa Veterinária Harbin (HVRI), na China, com a aprovação do Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais do país.

Os furões foram os primeiros a receber as partículas do vírus encontrado no Huanan Seafood Market em Wuhan ou encontrado em um paciente humano, respectivamente. De cada furão, foram coletados órgãos como traqueia, pulmão, coração, intestino delgado, cérebro, entre outros, para verificar como o RNA viral e o vírus infeccioso se espalhariam pelo organismo dos animais. 

O estudo também investigou a dinâmica de replicação dos vírus em animais, isolando dois grupos de furões infectados com os vírus. Lavagens nasais e amostras retais foram coletadas em dias alternados, além do monitoramento da temperatura corporal e sinais da doença ser feito por duas semanas. O vírus infeccioso foi detectado nas lavagens nasais dos furões e todos os animais apresentaram anticorpos contra SARS-CoV-2.

Um experimento semelhante foi realizado com sete gatos domésticos com idade entre seis e nove meses. Porém, o estudo explica que a coleta de lavagem nasais nos gatos não foi possível por estarem agressivos, por isso, apenas as fezes foram coletadas e o material genético do vírus foi verificado nos órgãos após a eutanásia. Os anticorpos contra SARS-CoV-2 foram detectados em quatro dos sete gatos.

O mesmo experimento foi realizado com sete cães por meio da coleta de amostras da faringe e do reto. Dois dos cães infectados produziram anticorpos e os demais animais apresentaram resultado negativo para SARS-CoV-2. A suscetibilidade de porcos, galinhas e patos ao vírus foi investigada usando a mesma estratégia usada para avaliar os cães, mas os testes de todos os animais deram soronegativos para SARS-CoV-2.

Em suma, o estudo conclui que furões e gatos são altamente suscetíveis, os cães têm baixa suscetibilidade, e porcos, galinhas e patos não são suscetíveis ao vírus. Além disso, o SARS-CoV-2 pode se transmitir entre gatos por via aérea e os felinos jovens apresentam menos resistência ao vírus.

 

Falhas na metodologia de pesquisa

Em resposta ao artigo, a professora Aline Santana da Hora, da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Uberlândia (Famev/UFU), publicou um comentário crítico sobre os experimentos na revista Nature, questionando os resultados imediatos e a longo prazo do estudo. Sua principal preocupação é com a perseguição e o abandono de animais, especialmente de gatos.

Segundo a professora, um animal ser infectado experimentalmente com altas concentrações de vírus não significa que ele será facilmente infectado com o mesmo vírus em condições naturais. “É isso que temos visto no mundo, já ultrapassamos a marca de 2 milhões de humanos positivos para o vírus causador da Covid-19, enquanto temos relatos de apenas dois gatos e dois cães em todo o mundo. Além disso, o número de animais usados nos experimentos foi muito pequeno”, destaca.

Em colaboração com o professor Paulo Eduardo Brandão, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP), a professora Aline Santana escreveu e publicou também um comunicado à comunidade veterinária destacando as principais falhas do experimento. 

O artigo, que foi publicado em um site que serve como repositório para textos ainda não publicados em revistas científicas, não passou pela revisão de no mínimo dois experts da área relacionada ao trabalho, que é obrigatória para a publicação em revistas científicas. Além disso, o artigo não apresenta dados laboratoriais que comprovem a saúde geral dos animais nem o status dos gatos para as principais viroses felinas que poderiam interferir nos resultados do experimento.

Santana aponta também que a agressividade dos gatos, descrita pelos pesquisadores como obstáculo para a coleta de lavagens nasais, é um sinal de estresse. “O estresse faz com que a imunidade mediada por células fique prejudicada. Essa imunidade é bastante importante para defesa contra patógenos intracelulares, como os vírus”, explica. “Por isso, um dos pilares da experimentação em animais é assegurar que os eles estejam em boas condições de bem-estar”.

“A detecção do material genético do vírus não significa que o animal está doente, porque podemos encontrar o material genético do vírus também em superfícies de objetos das residências de pessoas infectadas. Não temos comprovação científica que nenhum animal tenha ficado doente pelo SARS-CoV-2”, ressalta. Santana e Brandão concluem o comunicado frisando que não há evidências científicas de que os gatos possam se infectar em condições naturais  e serem uma fonte importante de SARS-CoV-2 para humanos.

 

Cuidados com os peludos

Santana reforça que alguns cuidados devem ser tomados para que os tutores de animais de companhia não transmitam o vírus para os pets e vice-versa.  Para os tutores de cães que precisam levar seus animais para passear para que façam suas necessidades fisiológicas, a recomendação é que os passeios sejam curtos, em horários e locais de pouca circulação de pessoas. Durante o passeio deve-se ter o comportamento de isolamento social, ou seja, não se deve conversar com outras pessoas nem deixar que o cão entre em contato com outros animais. Ao retornar do passeio, o tutor deve lavar as patas dos cães com shampoo específico. 

Os gatos sempre devem ser mantidos dentro das residências, independentemente da pandemia. “Os gatos que frequentam a rua têm sua expectativa de vida muito reduzida, por atropelamento, envenenamento e doenças infecciosas adquiridas com o contato com outros gatos de rua”, complementa. 

Práticas de higiene, como lavar as mãos, são fundamentais e não devem ser esquecidas antes e depois das interações com animais. Todas as pessoas suspeitas de Covid-19 devem ficar em isolamento de pessoas e animais. O ideal é que os cuidados com o pet sejam realizados por pessoas que não estejam suspeitas da doença. Se a pessoa morar sozinha com o animal, ela deve sempre usar máscara quando estiver lidando com o pet e o compartilhamento de alimentos não deve ser realizado. O tutor também não pode permitir que o animal lhe dê lambidas. O uso de álcool em gel e máscaras é contraindicado para animais.

 

Serviço

As doenças que são próprias dos gatos e de outros animais continuam acontecendo mesmo durante a pandemia. Por isso, para a comunidade de Uberlândia e região, o Hospital Veterinário (HV/UFU) continua realizando atendimentos em casos de urgência e emergência.

O hospital está localizado na Av. Mato Grosso, 3.289, Bloco 2S do Campus Umuarama, em Uberlândia/MG. São distribuídas senhas diárias para atendimento e o horário de funcionamento é de segunda a sexta-feira, das 7h às 18h (exceto feriados).

Para mais informações, entre em contato pelo telefone (34) 3225-8410 ou e-mail gerencia@hv.ufu.br.

 

Palavras-chave: COVID-19 coronavírus animais Aline Santana UFUContraOCorona

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