Publicado em 29/05/2023 às 10:44 - Atualizado em 22/08/2023 às 16:38
O Laboratório de Estudos de Feminicídios (LESFEM) foi fundado em 2022 e é composto por uma rede de pesquisadoras e pesquisadores da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Este grupo de pesquisadoras/es objetiva contribuir com a construção de dados sobre crimes de feminicídios no Brasil.
A tipificação “feminicídio” foi estabelecida pela Lei nº 13.104/15 (Lei do Feminicídio), que passou a vigorar em 9 de março de 2015. Trata-se, portanto, de um crime tipificado muito recentemente, mas que se fez presente em todas as etapas históricas do país. O feminicídio é classificado como uma qualificadora do crime de homicídio e considerado crime hediondo, o que possibilita punições mais severas.
Alguns trabalhos resultantes das pesquisas desenvolvidas no LESFEM encontram-se disponíveis e podem ser acessados por todas as pessoas que têm interesse no tema. Destacamos o relatório que apresenta descritivamente os dados referentes aos julgamentos de feminicídios realizados na Comarca de Londrina nos anos de 2021 e 2022, período em que foram julgados 23 (vinte e três) casos. Este relatório foi elaborado pela coordenadora geral do LESFEM, Silvana Mariano, docente da UEL e por Luciene Oliveira Vizzotto Zanetti e Kamila Klasmann e pode ser acessado pelo link https://linktr.ee/lesfem.
Márcio Ferreira de Souza, docente do Instituto de Ciências Sociais, representante da UFU no LESFEM e membro do Núcleo de Estudos de Gênero (Neguem-UFU), produziu em parceria com a professora Silvana Mariano dois artigos que foram publicados mais recentemente. O primeiro, intitulado “Feminicídio e humilhação de gênero: violações, degradação e extermínio de corpos femininos” (com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais – Fapemig, a partir da pesquisa: "Investigações sobre a humilhação como fenômeno social: bases teóricas, epistemológicas e empíricas - APQ-03372-18") encontra-se disponível na Revista Brasileira de História & Ciências Sociais e pode ser acessado pelo link: https://periodicos.furg.br/rbhcs/article/view/14541.
A análise realizada por Souza e Mariano parte da noção de humilhação como ação racionalmente orientada por práticas de assujeitamento e degradação moral e física, resultantes em feminicídios, a fim de indagar sobre mudanças e persistências nas visões e discursividades sobre o ato. O autor e a autora se apoiaram em cobertura da imprensa e em narrativas nos julgamentos no Tribunal do Júri para analisar entrecruzamentos entre gênero, raça e classe. O percurso do trabalho alude a casos históricos de feminicídio no Brasil e ao Memorial de Feminicídios de Londrina (Néias – Observatório de Feminicídios, 2015-2022), com registros de tentativas e concretização de feminicídios.
A despeito da suposta aleatoriedade, tais casos conectam entre si, pois expressam relações assimétricas de poder simbólico, legitimadoras de violações, degradações e extermínios dos corpos femininos. Souza e Mariano sustentam que, a despeito dos avanços legais recentes, nos julgamentos persistem práticas e percepções culturais e institucionais de depreciação das mulheres.
O segundo artigo, intitulado “A morte antecipada na forma de feminicídio: pelo direito à justiça, à verdade e à memória” (apoios do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq e do Néias – Observatório de Feminicídio Londrina) foi publicado no dossiê “A Morte e o Processo de Morrer nas Ciências Sociais: Perspectivas Sobre Um Fenômeno Multidimensional”, editado pela Revista Mediações, da UEL e pode ser acessado pelo link: https://ojs.uel.br/revistas/uel/index.php/mediacoes.
Neste artigo, Mariano e Souza articulam a sociologia da morte com a sociologia da violência para introduzir gênero e patriarcado como noções relevantes para as reflexões, nas Ciências Sociais, sobre a morte e o processo de morrer, buscando, igualmente, a compreensão estrutural sobre a morte produzida nas relações de poder que levam ao feminicídio, como forma de morte antecipada de mulheres. Como resposta à ordem social e jurídica que invisibiliza ou culpabiliza a vítima, a perspectiva vitimológica apresenta-se como recurso analítico em defesa do direito à justiça, à verdade e à memória.
Com base em estudos empíricos sobre casos de feminicídios consumados julgados na Comarca de Londrina nos anos de 2021 e 2022, demonstra-se como o poder patriarcal, traduzido na objetificação, coisificação e menosprezo de meninas e mulheres, produz feminicídios no contexto da violência doméstica e familiar e como, na resposta formulada judicialmente, apresentam-se riscos de naturalização, invisibilização e revitimização das mulheres.
Em março do corrente ano, a professora Márcia Santana Tavares, coordenadora do LESFEM, na UFBA, organizou a mesa redonda “Leituras Feministas sobre Violências de Gênero e Feminicídios”, por ocasião do Congresso UFBA 2023. Além da professora Márcia Tavares, a atividade contou com a exposição de Silvana Mariano, Márcio Ferreira de Souza, Vanessa Cavalcanti (UFBA) e Eduardo Carvalho (UniFTC), cujo vídeo pode ser acessado pelo link: https://www.youtube.com/watch?v=htqczJstLP4.
No 21º. Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia, a ser realizado entre 11 e 14 de julho de 2023, Silvana Mariano, Márcia Tavares e Márcio Ferreira de Souza coordenarão o Grupo de Trabalho “Feminicídios em perspectiva: teorias, legislações e políticas públicas”, acolhendo e debatendo resultados de pesquisas desenvolvidas em diversas instituições do país.
*Márcio Ferreira de Souza é professor associado do Instituto de Ciências Sociais da UFU.
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