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Série Mulheres e Meninas na Ciência

‘É legal saber direcionar a nossa inteligência e habilidades para questões femininas’

Tamires Alves é recém-doutora em Genética e Bioquímica e comenta como se sente mais útil pesquisando cânceres ginecológicos

Publicado em 23/02/2024 às 13:00 - Atualizado em 04/03/2024 às 08:06

No segundo período da faculdade, Alves já tinha a pretensão de seguir na área acadêmica. (Foto: Arquivo pessoal)

 

“Meu nome é Tamires. Tenho 29 anos, faço 30 daqui a dois meses e sou natural de Patos de Minas, ‘interiorzão’ de Minas Gerais”. Com um bom humor e sorriso no rosto, a egressa da terceira turma do curso de Biotecnologia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Campus Patos de Minas, se apresenta para a série "Meninas e Mulheres na Ciência".

Após graduada, a pesquisadora ingressou no Programa de pós-graduação em Biotecnologia (PPGBiotec), se integrando à primeira turma do mestrado em Biotecnologia em Patos. De lá para cá, alguns anos se passaram e surgiram oportunidades e desafios em sua caminhada. Mas a “Análise de dados de sequenciamento de nova geração e suas implicações voltadas para a saúde humana”, sempre a acompanhava. Este é o nome da pesquisa que norteou o doutorado da pesquisadora até janeiro de 2024, data especial em sua vida acadêmica, marcada pela defesa do doutorado em Genética e Bioquímica. 

A pesquisa aconteceu sob orientação do professor Matheus de Souza Gomes, e analisou o câncer de ovário por meio do sequenciamento do DNA Mitocondrial de pacientes com tumor primário e secundário. Ela verificou possíveis mutações com ovários saudáveis, a fim de buscar variantes significativas em todas as condições. “O câncer de ovário é considerado o câncer ginecológico mais difícil de ser diagnosticado, uma vez que a maioria dos tumores malignos de ovário só se manifesta em estágio avançado. Assim, estratégias para identificação precoce desse tipo de câncer são altamente almejadas”, comenta Alves. 

Os créditos do doutorado, que correspondem a horas-aula teóricas, a pesquisadora desenvolveu no no campus Umuarama, isso porque o campus de Patos não possui doutorado em seu programa de pós-graduação. Já na segunda parte, ela buscou atuar em parceria com instituições de outros lugares, mudou-se então para Belo Horizonte, onde trabalhou sua pesquisa no Instituto René Rachou, unidade da Fiocruz em Minas Gerais (Fiocruz Minas) com ênfase em doenças parasitárias. Depois migrou para a área da Oncologia, cuja pesquisa foi desenvolvida em parceria com o Instituto Mário Penna, posteriormente, retornando a Patos, concluiu a pesquisa no Laboratório de Bioinformática e Análises Moleculares (Lbam), fazendo experimentos nas áreas de Bioinformática, Genética e Biotecnologia.

Com experiências ao longo da carreira acadêmica que envolveram plantas, bactérias, biologia molecular e bioinformática, a recém doutora em Genética e Bioquímica pretende continuar na carreira de pesquisadora e em breve inicia suas atividades no pós-doutorado. 

Alguns detalhes a pesquisadora contou nesta entrevista para a série “Mulheres e Meninas na Ciência”:

 

Quem é você na plataforma Lattes? O que você pesquisa?

Eu trabalho com bioinformática desde 2014, esse interesse surgiu depois de assistir uma palestra do meu orientador [Matheus de Souza Gomes] eu pensei “combina bem com o contexto, ainda mais porque não tínhamos verba e muitos recursos para experimentos”, e aí eu gostei dessa área de programação. Hoje eu me considero uma analista de dados biológicos. Fiz análise de bioinformática no meu doutorado e hoje eu consigo trabalhar com dados de sequenciamento genético. 
 

E quem é você além do Lattes? 

Fora da academia eu gosto de fazer atividades físicas em geral, principalmente ao ar livre! Gosto de cachoeiras, praia e piscina. Devido à rotina acadêmica ser intensa, não consigo conciliar esportes coletivos, mas tenho feito musculação e esportes individuais. Outra coisa que me “reseta” da vida acadêmica é passar tempo com minha família, eu tenho muitos primos bebês e crianças, gosto muito de estar com eles.

 

Mulher mergulhando na piscina durante o fim da tarde
Além dos esportes, Alves tem praticado leitura: “É um hábito que retomei tem pouco tempo.” (Foto: Arquivo pessoal)

 

Como era a sua relação com a ciência quando você era criança?

Eu tinha em mente que queria fazer faculdade. Lembro que estava terminando o fundamental e entrando no ensino médio, quando surgiu os rumores de que a UFU viria para Patos. E aí eu fiquei olhando assim, pensando: “uma federal em Patos?” Parecia uma abstração na época, até mesmo porque a gente nem sabia se ia acontecer mesmo e como funcionaria. 

Quando criança mesmo eu sempre quis ser cientista. Era curiosa, bem perguntadora das coisas, então a ciência era uma coisa que eu gostaria muito. E aí quando veio essa oportunidade de fazer uma federal aqui em Patos…, dentre os três cursos, eu me interessei pela Biotecnologia. Na época, eu estava no segundo ano do ensino médio, já aproveitei e busquei um curso técnico que “mexe” com laboratório para ver se eu gostava, e aí eu curti muito.  
 

Você tem alguma boa história que já vivenciou como cientista e que quando conta todo mundo acha interessante? Poderia nos contar também?

Acho que foi o primeiro congresso que eu tive que apresentar em inglês. Apresentei no Simpósio Internacional sobre Esquistossomose, em Ouro Preto, e por um momento fiquei tensa [risos]. Eu tinha uma fluência básica, a leitura e compreensão eu achava mais tranquilo por conta das atividades acadêmicas. Foi engraçado porque as pessoas se interessavam pela minha pesquisa, me faziam perguntas, e são assuntos que não são simples, mas eu respondia, consegui desenvolver e gesticular bastante, deu certo! Depois corri atrás de umas aulas de conversação, sentia que eu estava limitada para trocar ideia. Aí depois de uns seis meses fui para um curso no Uruguai, então eu cheguei lá e já consegui conversar e entender bem o que estava sendo dito. Ele foi também uma experiência bem marcante, aquela da primeira viagem internacional, então foi uma das coisas que a academia me proporcionou, né? 
 

Quais eram suas expectativas? E como está hoje?

Por incrível que pareça, durante o curso de Biotecnologia não teve nenhum momento que eu titubeei e falei, “será que é isso mesmo que eu gosto? Será que é isso que quero para minha vida?” Essa escolha foi bem certeira. Lá no finalzinho eu pensei: “Beleza, o que eu vou fazer depois?” Mas sabia que eu já queria ir para o mestrado. Eu falei “Poxa, esse negócio de ser cientista tô achando legal. Gostei!"

Uma outra ideia que eu tinha era sobre a expansão do campus aqui em Patos também. Eu pensei: “Nossa, esse campus que tá aqui em Patos tem só três cursos, e nem são tão populares assim, né? Então em algum momento eles vão trazer novos cursos pra cá. Quando o campus estiver pronto, com certeza vão abrir novas oportunidades, novos cursos e vão precisar de professor”. Eu estava na graduação, lá para o terceiro, quarto período e até hoje esses novos cursos não chegaram aqui. Mas hoje já tenho outra mentalidade também.

Hoje, na verdade, eu cheguei no último ponto, né? Estou animada para continuar pesquisando O pós-doc é um emprego para doutorando desempregado, mas sobre a questão de dar aula, acredito que vai acontecer em algum momento. Todo mundo tem um pouco desse vínculo, até quem fala que queria ser só pesquisador, não tem como, eventualmente é convidado para uma palestra. 

 

Do que precisamos para ter mais meninas e mulheres na ciência?

Com os últimos anos, acredito que vem abrindo mais espaço e principalmente para o campo de pessoas que gerenciam. Tem algumas iniciativas do governo que estão levando em consideração a maternidade, e muitas outras coisas, então eu acho que envolve essas questões de políticas públicas, né, mas tem ajudado e animado a gente a permanecer nessa carreira.

 

Mulher apreciando uma exposição de arte
Eu tive muita sorte de ter um orientador desde a graduação, que é muito igualitário, tanto nas oportunidades quanto nas discussões. (Foto: Arquivo pessoal)

 

Sempre fui tratada de igual para igual, com independência de gênero e acho que talvez seja a coisa mais relevante de todas, e no quesito de oportunidades também. Trabalhei com câncer de ovário no doutorado e se der certo a oportunidade [de pós-doc] vou trabalhar com câncer de endométrio. Acho que é muito legal ter mulheres trabalhando com esses cânceres ginecológicos, a gente também saber direcionar a nossa inteligência e habilidades para essas questões femininas, é legal de trabalhar, e eu me sinto mais útil para as mulheres como todo, do que trabalhando com câncer mais geral.


 

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