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#ESPECIALUFU45

Como a UFU tem sobrevivido ao sucateamento do ensino no Brasil?

Seis anos após a aprovação do Teto de Gastos, a Universidade Federal de Uberlândia ainda sofre com o impacto dos cortes

Publicado em 13/02/2023 às 09:21 - Atualizado em 22/08/2023 às 17:04

Arte: Nadja Nobre / Agência Conexões

A Educação Superior no Brasil vem sofrendo um processo de sucateamento cujo marco inicial é o projeto de emenda constitucional popularmente conhecido como Teto de Gastos. Aprovada no final do ano de 2016, após a deposição da presidente Dilma Rousseff, a Emenda Constitucional nº 95 estabelece um limite para gastos federais com duração de 10 anos. O objetivo foi enrijecer as despesas públicas do país voltadas a gastos essenciais, como saúde e educação.

Em uma linguagem mais simples: os administradores públicos podem gastar, no máximo, o valor que foi estipulado pela emenda para manter esses serviços operando, explica o pró-reitor de Extensão e Cultura da Universidade Federal de Uberlândia, Hélder Eterno da Silveira. Nenhum tipo de investimento além do valor limite pode ser feito sem autorização do Congresso Nacional ou sem uma outra emenda constitucional que ajuste a situação fiscal do país. 

De lá pra cá, as universidades brasileiras enfrentam uma verdadeira "seca" no orçamento e tiveram que abrir mão de diversos recursos para continuar de pé. Segundo publicação do Le Monde Diplomatique Brasil, desde o começo das políticas de austeridade, em 2015, foi contabilizada uma perda de R$ 99,5 bilhões em investimentos na educação, sendo R$ 32,6 bilhões somente em 2019, com base em cálculos da Campanha Nacional de Direito à Educação (CNDE). Em 2020, o investimento por aluno era de R$ 303,50 por mês. Em 2022, o valor subiu para R$ 470,32 mensais, porém, ainda está muito distante do que foi estipulado no Plano Nacional da Educação (PNE) 2014-2024.

A situação já era alarmante antes da medida de ajuste fiscal. O PNE previa a implantação do CAQi (Custo Aluno-Qualidade Inicial) e o CAQ (Custo Aluno-Qualidade) até 2016. Em um estudo divulgado em 2019 pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), com dados de 2016, a média anual de custo com estudantes em todos os níveis de educação foi de US$ 10.759 anuais, enquanto no Brasil, no mesmo período, a média ficou em US$ 4.240 anuais.Depois da implementação da Emenda Constitucional que estabeleceu o Teto de Gastos, os investimentos foram ainda mais contingenciados. Na UFU a situação não foi diferente. O pró-reitor de Planejamento e Administração, Darizon Alves de Andrade, relembra que a universidade sofreu impactos na prestação de serviços. “Tivemos que fazer reduções significativas de postos de trabalho nos diversos contratos. Fizemos também redução na quantidade de bolsas de estágio oferecidas, tínhamos um número grande de bolsas e foi necessário reduzir”, conta.

Hoje, em fevereiro de 2023, a universidade ainda enfrenta um déficit no orçamento, que vem sofrendo reduções ano a ano. Recentemente, tivemos uma paralisação dos estudantes em função do não pagamento de bolsas de assistência estudantil e de bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado – algumas atrasadas há meses. Além dos estudantes, os trabalhadores do Restaurante Universitário também pararam em razão da falta de pagamento de seus salários, já que a UFU não tinha mais condições de arcar com as despesas de contratos de alimentação, segurança, limpeza, transporte e auxílio estudantil, como informou em nota oficial.

Em junho de 2022, a UFU sofreu um corte R$ 9,5 milhões e, em dezembro, foi impedida de acessar os R$ 2,7 milhões que ainda restavam. Em outra nota, publicada em 29 de novembro de 2022, no seu perfil oficial do Instagram, a universidade anunciou que as instituições federais de Ensino Superior foram surpreendidas pelo governo com mais um bloqueio de verba. Do valor remanescente de orçamento, que vinha salvando as despesas emergenciais da instituição, restavam apenas R$ 71,00 no sistema.

O planejamento financeiro da UFU é feito com base na Lei Orçamentária Anual (LOA), aprovada anualmente pelo Congresso Federal. Porém, os contingenciamentos e cortes no orçamento aprovado para 2022 tornaram inexequível o planejamento financeiro da instituição, como também foi divulgado em nota oficial no portal Comunica UFU. A universidade vem reivindicando junto ao Ministério da Educação uma recomposição orçamentária e ainda aguarda os encaminhamentos a serem propostos pelo novo governo.

O pró-reitor de Planejamento e Administração dá ênfase na redução do valor, reafirmando seu decréscimo em relação à inflação e a dificuldade da UFU em se manter funcionando com os cortes. “Se ele [o orçamento] é em valor absoluto, deveria estar subindo, porque as despesas vão subindo. Se ele é corrigido pela inflação, no mínimo, deveria permanecer constante”, enfatiza.

Hélder Silveira também reforça o quanto o orçamento vem diminuindo ao decorrer dos anos. “As pessoas acreditam que o reitor da universidade tem uma conta que tem dinheiro, não é bem assim. Nós temos autorização para utilizar o orçamento que está na conta do Tesouro Nacional, mas o orçamento cada vez é menor e aquela porçãozinha que vem sendo diminuída não nos dá margem de negociação”, explica.

A situação afeta diversas áreas da universidade; por exemplo, gerando a obsolescência de equipamentos. Andrade explica que a universidade não pode comprar, anualmente, a quantidade que precisaria para renovar o parque tecnológico, como computadores e equipamentos de laboratório, que vão funcionando com equipamentos que estão envelhecendo. O pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação, Carlos Henrique de Carvalho também explica que a falta de investimentos acaba se refletindo na sociedade. “Se tivesse mais investimento, se pudesse dar melhores condições para os laboratórios, talvez a comunidade mais próxima da UFU teria uma melhoria na qualidade de vida”, sintetiza.

Porém, com certeza os principais impactos foram sentidos pelos estudantes. Conforme Elaine Saraiva, pró-reitora de Assistência Estudantil, a universidade, atualmente, oferece 40% menos auxílios a estudantes, no que tange a moradia, alimentação e transporte, se comparado a 2016 e 2017. E os coordenadores gerais da atual gestão do Diretório Central dos Estudantes (DCE), Amanda de Castro e Edivaldo Carvalho, confirmam esse dado e denunciam. “Esse corte delimita quantos pobres vão poder estudar, quantos pobres vão poder ter acesso ao Ensino Superior”, afirma Edivaldo.Já Hélder Silveira alerta que o descaso com a educação no Brasil também vem acontecendo no Ensino Fundamental. “Se nós olharmos para as escolas públicas do país, nas universidades públicas no país, vamos perceber que há um déficit de investimentos muito grande. Na UFU [percebemos isso] nas obras, nas construções de investimento, na bolsa de assistência, nos projetos de ensino, pesquisa, extensão”, acrescenta Silveira.

Em meio às circunstâncias adversas, temos uma universidade que luta para continuar oferecendo um ensino de qualidade, produzindo pesquisas que fazem a diferença e construindo atividades de extensão que possibilitam uma troca frutífera com as comunidades que acolhem em seus espaços os campi da UFU. A Conexões apresentará, a partir de hoje, uma série de conteúdos que pretendem refletir sobre as consequências deste processo de sucateamento da educação no Brasil, especialmente na Universidade Federal de Uberlândia. O especial #UFURESISTE - Seis anos de Teto de Gastos é uma produção da Conexões em colaboração com a Diretoria de Comunicação Social da Universidade Federal de Uberlândia. Serão quatro semanas ampliando as vozes de diferentes pessoas que direta ou indiretamente vem sendo afetadas pelos cortes orçamentários e têm buscado alternativas para manter a universidade em funcionamento.

A universidade luta para continuar oferecendo um ensino de qualidade, além de produzir pesquisas que fazem a diferença e desenvolver atividades de extensão com as comunidades. (Foto: Alexandre Costa / Dirco-UFU))

 

Política de uso: A reprodução de textos, fotografias e outros conteúdos publicados pela Diretoria de Comunicação Social da Universidade Federal de Uberlândia (Dirco/UFU) é livre; porém, solicitamos que seja(m) citado(s) o(s) autor(es) e o Portal Comunica UFU.

 

A série "ESPECIALUFU45" reúne textos escritos por membros da equipe da Diretoria de Comunicação Social (Dirco), mas também está aberta à contribuição de outros integrantes da comunidade acadêmica da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). As sugestões de temas a serem abordados, bem como o envio de materiais para avaliação e, em caso de aprovação, posterior publicação, podem ser realizados por meio do formulário eletrônico disponível em: www.comunica.ufu.br/divulgacao.

 

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