Publicado em 19/03/2025 às 10:11 - Atualizado em 19/03/2025 às 11:40
Vivemos em um tempo paradoxal. Nunca estivemos tão conectados e, ao mesmo tempo, nunca fomos tão solitários. A Inteligência Artificial (IA) tem revolucionado o mundo, trazendo eficiência, comodidade e um universo de possibilidades que antes pertenciam apenas à ficção científica. No entanto, em meio a essa explosão tecnológica, surge uma questão incômoda e urgente: como estão as relações humanas na era pós-IA?
Zygmunt Bauman, em sua teoria da "modernidade líquida", alertou sobre a fragilidade dos laços humanos em um mundo cada vez mais rápido e descartável. Hoje, essa liquidez se intensifica com a IA, pois vivemos rodeados por assistentes virtuais, algoritmos preditivos e chatbots que nos entendem melhor do que muitos amigos próximos. A tecnologia suprime o esforço da interação humana e nos acostuma a uma comunicação objetiva, automatizada e sem profundidade emocional.
Sherry Turkle, psicóloga do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), também levanta uma reflexão importante em seu livro "Alone Together" ("Juntos, mas Sós"). Ela argumenta que, paradoxalmente, quanto mais a tecnologia avança, mais nos isolamos em nossas bolhas digitais. Redes sociais e inteligências artificiais personalizam conteúdos de acordo com nossos gostos, criando uma ilusão de conexão, mas reforçando um isolamento emocional e um empobrecimento da comunicação real.
Antes, aprender a se relacionar exigia convivência, paciência e compreensão das nuances emocionais do outro. Hoje, com a IA mediando tantas interações, estamos perdendo a capacidade de lidar com a complexidade das relações humanas. Resolvemos conflitos por emojis, terminamos relações por mensagens curtas e evitamos o desconforto de conversas difíceis com a intermediação de telas. A empatia, que se desenvolve na interação real, vai se tornando um luxo raro.
É importante destacar que a IA não é, por si só, uma inimiga das relações humanas. Ela pode ser uma ferramenta incrível para aprimorar a vida, desde que usada com consciência. O problema está em sua adoção acrítica, sem que nos perguntemos: estamos utilizando a tecnologia para nos conectar ou para nos afastar ainda mais?
Cabe a nós decidir se a IA será um suporte para expandir nossas potencialidades humanas ou uma muleta que nos priva do que nos torna essencialmente humanos: o calor de um olhar, o aperto de mão sincero, a vulnerabilidade de uma conversa cara a cara.
A velocidade da IA também afeta o tempo de escuta e a profundidade das relações. A pressa da sociedade digital nos ensina que tudo precisa ser imediato: respostas, reações, validação. Mas o amor, a amizade e o respeito são processos que demandam tempo, contato humano e, sobretudo, presença.
No trabalho, na família, na escola, na igreja e na vida social, estamos diante de um desafio: como equilibrar a presença da IA com a necessidade de conexões autênticas? Talvez seja hora de nos perguntarmos: quantas das nossas interações diárias são reais e significativas? Quanto tempo investimos em construir vínculos profundos?
A tecnologia avança, mas a humanidade não pode retroceder. A inteligência artificial pode nos ajudar em muitas coisas, mas nunca substituirá um coração que realmente sabe escutar.
*Letrólogo, especialista em psicopedagogia, mestre de cerimônia, técnico em assuntos estudantis lotado na Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (ProPP)
A seção "Leia Cientistas" reúne textos de divulgação científica escritos por pesquisadores da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). São produzidos por professores, técnicos e/ou estudantes de diferentes áreas do conhecimento. A publicação é feita pela Divisão de Divulgação Científica da Diretoria de Comunicação Social (Dirco/UFU), mas os textos são de responsabilidade do(s) autor(es) e não representam, necessariamente, a opinião da UFU e/ou da Dirco. Quer enviar seu texto? Acesse: www.comunica.ufu.br/divulgacao. Se você já enviou o seu texto, aguarde que ele deve ser publicado nos próximos dias.
Política de uso: A reprodução de textos, fotografias e outros conteúdos publicados pela Diretoria de Comunicação Social da Universidade Federal de Uberlândia (Dirco/UFU) é livre; porém, solicitamos que seja(m) citado(s) o(s) autor(es) e o Portal Comunica UFU.
Palavras-chave: Leia Cientistas inteligência artificial relações humanas conectividade
Política de Cookies e Política de Privacidade
REDES SOCIAIS